quarta-feira, 5 de agosto de 2009

França detém vanguarda da laicidade

Folha de S. Paulo

05/08/2009

Helio Schwartsman, da equipe de articulistas
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A discussão sobre os símbolos religiosos em espaços públicos chega ao Brasil com mais de um século de atraso.
A França, que não por acaso inventou o conceito de laicidade, representa a vanguarda da iconoclastia. Lá os crucifixos foram retirados dos tribunais e dos colégios nos anos 1880. Na mesma década, o ensino religioso foi suprimido das escolas públicas, e magistrados e militares foram proibidos por lei de participar em caráter oficial de festas católicas.
A apoteose do movimento, porém, veio em 1905, com a edição da Lei da Laicidade, que rompe unilateralmente a concordata entre Paris e o Vaticano, confisca bens da igreja e suspende todas as subvenções que eram concedidas a ministros e cultos. Esta última medida poupou aos cofres públicos 35 milhões de francos anuais.
O papa Pio 10º (1903-1914), é claro, não gostou e, em 1906, baixa a encíclica "Vehementer nos", na qual denuncia o diploma francês e qualifica a separação entre Estado e igreja como "tese absolutamente falsa", "erro perniciosíssimo" e "em alto grau injurioso para com Deus".
Mais recentemente, os franceses voltaram à carga antirreligiosa, mas o alvo deixou de ser a Igreja Católica e passou a ser o islamismo. Em 2004, o Parlamento emendou a Lei da Laicidade para proibir alunos de escolas públicas de usar ícones religiosos ostensivos como os "hujub" (véus muçulmanos). O presidente Nicolas Sarkozy pede agora a proscrição da burca, o traje inteiramente fechado usado por algumas poucas mulheres islâmicas.
Nos EUA, embora a laicidade também esteja na Constituição, o anticlericalismo nunca esteve na ordem do dia. Pelo contrário, os EUA são, de longe, a nação mais religiosa do mundo desenvolvido.
Instada a manifestar-se sobre símbolos religiosos em tribunais, uma Suprema Corte, dividida, resolveu sair pela tangente. Em 2005, tomou uma decisão ambígua, na qual permitiu a um tribunal manter um monumento com os Dez Mandamentos, mas proibiu duas outras cortes de fazer o mesmo. A diferença apontada pelos juízes era o contexto. No primeiro tribunal o monumento estava ao lado de outras obras. Nos demais, os Dez Mandamentos apareciam isoladamente, no que foi interpretado como uma violação ao princípio da laicidade do Estado.

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