sábado, 23 de maio de 2009

Obama e Guantanamo

Folha de São Paulo

São Paulo, sexta-feira, 22 de maio de 2009




Obama quer "limpar bagunça" de Guantánamo
Presidente reitera que fechará prisão em base militar, apesar de admitir não ter encontrado solução para parte dos presos

Em discurso sobre segurança, democrata diz que governo Bush criou sistema que "não foi eficiente e deixou de usar nossos valores como bússola"



Obama apresenta no Arquivo Nacional novos planos para Guantánamo

ANDREA MURTA
DE NOVA YORK

Acusando o governo anterior de ter criado uma "bagunça" com as controversas detenções em Guantánamo, o presidente dos EUA, Barack Obama, defendeu em discurso ontem seu plano de fechar a prisão até janeiro de 2010 e disse que o país só estará seguro se basear suas políticas em valores fundamentais de justiça e liberdade. Ao mesmo tempo, confirmou sua intenção de levar alguns dos presos de Guantánamo a penitenciárias e tribunais dentro dos EUA e indicou que vários outros serão detidos indefinidamente e sem julgamento. Obama escolheu como cenário da fala o Museu dos Arquivos Nacionais, em Washington, onde discursou rodeado pela Constituição, pela Carta dos Direitos e pela Declaração de Independência dos EUA. "Acredito firmemente que no longo prazo não podemos manter esse país seguro se não colocarmos em prática nossos valores mais fundamentais. Não digo isso apenas por idealismo, (...) mas porque eles nos fortalecem", afirmou. A fala vem em momento delicado para o governo. O fechamento de Guantánamo em um ano, determinado pelo presidente logo após a posse, enfrenta críticas dos que temem a soltura de terroristas e a manutenção destes em solo americano. Mesmo o Congresso de maioria democrata negou fundos para fechar a prisão sem um plano mais detalhado sobre o destino dos detidos. Obama responsabilizou o antecessor George W. Bush ao dizer que a questão do destino dos presos "não foi criada por minha decisão de fechar o complexo". "O problema existe por causa da decisão de abrir [a prisão em] Guantánamo." Ele disse que as decisões tomadas nos últimos oito anos estabeleceram uma abordagem legal ""ad hoc" [extraordinária e para um fim específico] que não foi nem eficiente nem sustentável e deixou de usar nossos valores como bússola". "Mais de 525 detidos foram libertados de Guantánamo sob o governo Bush (...) antes da minha chegada ao poder e da ordem de fechar a prisão. Guantánamo provavelmente criou mais terroristas no mundo do que jamais deteve." Obama celebrou o que seu governo já fez, como a ordem para o fim do uso de técnicas de tortura em interrogatórios. "Posso dizer hoje que, sem exceções, os EUA não torturam."

Destino dos presos
Mas as transformações que o presidente quer implementar na abordagem a detenções de suspeitos de terrorismo não são livres de controvérsia. Uma das mais polêmicas é a manutenção de detidos sem julgamento por tempo indeterminado. São presos que o governo diz que não podem ser julgados nem em tribunais federais nem em comissões militares, mas que tampouco podem ser libertados por serem considerados ameaças ao país. "Não soltaremos ninguém que ponha em risco nossa segurança nacional", afirmou Obama. O governo, disse, terá que criar um marco legal específico para lidar com esses presos. "Tenho que ser honesto; essa é a questão mais difícil que enfrentaremos. Temos que ter padrões claros, defensáveis e legais para aqueles que caem nessa categoria, para que não cometamos erros. Temos que ter um processo detalhado de revisão para que cada detenção prolongada seja cuidadosamente avaliada e justificada." Ativistas aliados expressaram decepção. "Obama se envolveu na Constituição [no discurso] e então começou a violá-la ao anunciar que criará um esquema de detenções preventivas que serve apenas para mudar Guantánamo de lugar e dar um outro nome", disse Michael Ratner, do Centro de Direitos Constitucionais de Nova York. Noutro anúncio controverso, Obama reiterou que alguns detidos serão levados a prisões de segurança máxima em solo americano. Os que violaram leis americanas serão julgados em tribunais federais; os suspeitos de crimes de guerra serão enviados a comissões militares -tribunais de exceção criados por Bush mas que Obama quer emendar para expandir garantias legais aos réus. Esse ponto foi rejeitado por republicanos. "Não podemos ter esses terroristas chegando a nosso sistema de prisões", disse a senadora Kay Hutchinson. "Essas pessoas não podem ser postas com presos americanos em comunidades onde poderão causar problemas."

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