Carta Capital
25/05/2009
Redação CartaCapital
As derivas do ministro italiano do Interior, Roberto Maroni, referentes aos passageiros clandestinos que desembarcam em Lampedusa poderão delinear uma política comum europeia desumana para pessoas em busca de asilo. Às vésperas das eleições legislativas europeias marcadas para o início de junho, Maroni, do Partido Liga Norte, tomou uma decisão nunca dantes navegada pela União Europeia: nos dias 6 e 10 de maio, mandou de volta à Líbia cerca de 500 clandestinos. Maroni rechaçou os clandestinos sem sequer interrogá-los sobre as razões que os levaram a deixar seus países. A Líbia ignora qualquer procedimento de proteção ou asilo.
Segundo a Convenção relativa ao Estatudo dos Refugiados de 1951 das Nações Unidas, pessoas em busca de asilo têm o direito a tratamento de primeiros socorros e a interrogação preliminar. Caso estejam sujeitas a riscos de vida em seus países, podem receber asilo político. A Itália é signatária da Convenção de 1951 e, em tese, não pode rechaçar clandestinos vindos da Líbia e Tunísia e aportados à ilha mediterrânea de Lampedusa. Embora a apenas 113 quilômetros da Tunísia, a travessia para Lampedusa pode levar entre dezessete horas e seis dias. Os clandestinos pagam cerca de mil euros aos contrabandistas e não têm direito a levar água e comida.
No final de março, um barco de clandestinos em direção a Lampedusa naufragou na costa da Líbia, deixando 237 mortos. No mesmo dia, outras embarcações sumiram. Até agora não se sabe o número de vítimas. Sabe-se, porém, que desde 1988, 3.163 clandestinos desapareceram entre o Norte da África e Lampedusa. Aqueles que chegam à ilha padecem de náusea, desidratação, hipoglicemia e diarreia. Numerosas crianças e pessoas idosas morrem durante a travessia.
Maroni considerou sua estratégia um momento histórico na luta contra a imigração clandestina. Está claro que o ministro busca votos nas legislativas europeias. Seu empenho contra clandestinos remonta ao final de janeiro. No dia 23 daquele mês, Maroni transformou o Centro de Primeiro Acolhimento de Lampedusa em Centro de Identificação e de Expulsão. Até aquele dia, os clandestinos recebiam tratamento de urgência e eram enviados à Península em cerca de 48 horas. Aqueles cujas identidades não ficavam estabelecidas ao cabo de dois meses eram expulsos.
A despeito de infringir princípios básicos de direitos humanos, a política adotada por Maroni tem o claro apoio do premier Silvio Berlusconi. Semanas atrás, o chamado Tratado de Amizade entre Itália e Líbia, assinado em agosto de 2008, foi ratificado. A nada surpreendente amizade entre Berlusconi e Muammar Kadafi tem clara inspiração comercial. Empresas italianas realizarão investimentos no valor de 5 bilhões de dólares nos próximos 25 anos em infraestruturas de base na Líbia. Uma condição para a fluidez dos investimentos: Trípoli terá de participar da luta contra o terrorismo e a imigração clandestina.
A Líbia não é signatária da Convenção de 1951. Em Trípoli desenrola-se um jogo duplo em relação aos contrabandistas. Ora são ferozmente reprimidos pelas autoridades, ora, mediante subornos, são tolerados. O silêncio por parte da UE é ensurdecedor.
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