Valor Econômico
07/01/2009
Pouco mais de dois anos após a desastrada aventura militar no Líbano, as tropas de Israel escrevem mais um capítulo sangrento na história do Oriente Médio. A invasão da Faixa de Gaza, antecedida por pesados bombardeios em uma das regiões mais densamente povoadas do mundo, trará inevitavelmente dor, revolta e uma grande perda de vidas. Em sua ofensiva, Israel conta com o apoio explícito do governo Bush, da complacência garantida das ditaduras dinásticas árabes e da estupidez terminal do fanatismo islâmico.
Não há dúvidas de que Israel foi atacado por militantes do Hamas, assim como é certo que o severo bloqueio econômico imposto pelos israelenses à Faixa de Gaza, em meados de 2007, fatalmente traria reações radicais de descontentamento. Israel tratou uma região miserável com menos que pão e água e a isolou do mundo em retaliação a um governo livremente eleito. A tentativa de asfixiar o Hamas foi seguida pela União Européia, pelos EUA e, em alguma medida, pela Autoridade Nacional Palestina, que perdeu o controle da região. Cercado, o Hamas não procurou ampliar seu espaço pela negociação, mas pela força das armas. Toscas diante das modernas armas israelenses, elas podem causar muitos estragos quando disparadas aleatoriamente sobre a população civil, seu alvo principal. Erro de cálculo ou não, o Hamas atraiu para a população palestina mais uma vez o triste cortejo de fogo, sangue e destruição aos territórios ocupados por Israel. O Hamas nada ganhou com suas provocações, sairá militarmente machucado dessa empreitada irresponsável e pode perder o comando administrativo de Gaza, no final.
Outros ingredientes se uniram para trazer aos lares palestinos a tempestade perfeita. Há eleições em Israel, época segura para demonstrações grosseiras de belicosidade e salvacionismo nacional. A eleição de fevereiro foi particularmente propícia à disputa sobre qual partido defende melhor o país de seus inimigos. O governo de Ehud Olmert, do Kadima, foi desmoralizado por escândalos de corrupção e pela inépcia militar da aventura libanesa. Para resgatar suas credenciais de segurança nacional, o trabalhista Ehud Barak, candidato e atual ministro da Defesa, esmerou-se na preparação do brutal e sanguinário ataque a Gaza. Ele disputa com a chanceler Tzipi Livni, do Kadima, a chance de impedir nas urnas a volta ao poder do Likud, cujo candidato é Binyamin Netanyahu. Todos os disputantes pregam a solução armada contra o Hamas e não é à-toa que o apoio à escalada militar conte desta vez com o apoio esmagador da população israelense.
Ironicamente, o Kadima volta à Gaza armado até os dentes, quando foi a saída unilateral e sem condições de lá, patrocinada pelo falcão Ariel Sharon, que provocou a ruptura no sistema partidário do país, criou novas chances para a paz e o novo partido. O Kadima fez um governo medíocre e voltou a gravitar em torno do velho e fragmentado sistema político israelense. Para ganhar as eleições, precisa fazer uma política semelhante às mais radicais do Likud e também obter uma vitória esmagadora - altamente destrutiva - em sua incursão à Gaza, ainda que para isso desfigure os poucos traços distintivos do partido. Esse é um dos motivos pelos quais as tentativas diplomáticas tendem ao fracasso. As disputas internas em Israel contam bem mais.
Israel não resolverá nenhum de seus problemas pela via militar, como a história está cansada de mostrar. A estratégia do terror e do uso indiscriminado da força, que se tornou o modus operandi de Israel, aumenta a destruição, o número de mortes e, também, a indignação dos sobreviventes. Israel parece ter apenas estratégias de ataque, e nenhuma de defesa, enquanto que sua diplomacia produz ultimatos em série. O Hamas será punido, mas não destruído, atentados e bombas continuarão infernizando a vida dos israelenses enquanto não houver um acordo de paz entre todos os envolvidos. O trágico destino da região é que todas as partes sabem disso há muito tempo e caminhem cegamente para o confronto. A saída é um cessar-fogo imediato, com uma força internacional de paz nas regiões de fronteira para garantir a trégua e a supervisão de observadores internacionais. Longe de ser uma solução duradoura, ela pode pelo menos interromper o banho de sangue em Gaza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário