domingo, 22 de março de 2009

Revisionismo promove visão positiva de Stalin

O Estado de São Paulo

22/03/2009

Campanha oficial para impulsionar nacionalismo e recuperar o orgulho russo favorece imagem do ditador

Renata Miranda

As tentativas do presidente Dmitri Medvedev e do premiê Vladimir Putin de impulsionar o nacionalismo para recuperar o orgulho do povo russo começam a mostrar seus primeiros efeitos com o aumento da admiração pelo ditador soviético Josef Stalin (1924-1953). Mais de 50 anos após o fim de seu regime, Stalin é lembrado mais como o herói que transformou a Rússia em uma superpotência do que como o tirano responsável pela morte de milhões de pessoas.

"Nos últimos anos, o governo tem tentado reconstruir a imagem da Rússia como um Estado forte, livre da humilhação sofrida após a queda da União Soviética, e Stalin personifica todo o poder que o país tinha", afirmou ao Estado, por telefone, a analista política Maria Lipman, do Instituto Carnegie Endowment para Paz Internacional, de Moscou. "A admiração por ele é quase natural na Rússia."

No início do mês, defensores dos direitos humanos mostraram-se preocupados com a simpatia que a figura do ditador ainda desperta em muitos russos e chegaram a pedir um programa de "desestalinização" da Rússia. No fim do ano passado, em um concurso para escolher a figura histórica que mais bem representava a Rússia, Stalin recebeu 520 mil votos, conquistando o terceiro lugar da disputa.

Um estudo de 2007 feito pelo Yuri Levada Centre indicou que 54% dos jovens russos acreditam que Stalin fez mais o bem do que o mal e 46% dos entrevistados discordam da ideia de que o ditador era cruel. A pesquisa ainda mostrou que 17% dos jovens não acreditam que o líder soviético foi responsável pela prisão, tortura e execução de milhões de inocentes.

Os números exatos das vítimas do regime stalinista não são conhecidos, mas acredita-se que 18 milhões de pessoas tenham sido enviadas aos gulags (campos de concentração e trabalho forçado) durante o governo de Stalin. Outros 10 milhões de camponeses morreram ou foram mortos durante a coletivização do início dos anos 30 e mais de 1 milhão de pessoas foram executadas nos expurgos de 1937-38.

ESTRATÉGIA

"Apesar de todas as atrocidades cometidas por seu regime, a popularidade de Stalin ainda é imensa", disse a especialista em política russa Alena Ledeneva, da University College London. De acordo com ela, está em curso na Rússia uma estratégia do governo para remodelar a imagem do ditador. "Para recuperar o sentimento de orgulho nacional, o governo está escolhendo apenas um lado da história para apresentar aos jovens", disse Alena.

Um manual para professores de história nas escolas russas, aprovado em 2007 por Putin, faz um revisionismo sobre o regime do líder soviético e descreve a repressão do período como "um mal necessário".

"Todas as passagens negativas foram amenizadas e, com isso, o governo tenta apagar um pedaço importante da história", disse Alena. "A Rússia ainda reluta em criticar seu passado, tornando-se, assim, refém dos fantasmas soviéticos."

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