domingo, 30 de novembro de 2008

EUA e América Latina

O jornal O Estado de São Paulo do dia 30 de novembro de 2008 traz editorial do The New York Times sobre a relação entre o presidente eleito dos EUA, Barack Obama, e a América Latina.


THE NEW YORK TIMES - EDITORIAL

É uma chance única para Obama melhorar laços com região que tem interesses em comum com EUA

O governo George W. Bush deixa atrás de si tanto tumulto e ressentimento no mundo inteiro que o presidente eleito Barack Obama poderá se sentir tentado a deixar para mais tarde a questão das relações estremecidas entre os Estados Unidos e a América Latina.

Seria falta de visão de sua parte. Esta é uma oportunidade única para melhorar os laços com uma região que tem interesses e valores fundamentais em comum com os Estados Unidos. E considerando a crise por que passam estas relações no atual momento, bastaria apenas bom senso e sensibilidade para obter progressos.

Em primeiro lugar, o governo Obama poderia arrebanhar muita boa vontade defendendo uma ajuda maior, na maior parte proporcionada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), aos países latino-americanos arrastados pela onda do derretimento financeiro.

Acima de tudo, os líderes latino-americanos querem se certificar de que o governo de Washington está disposto a falar seriamente - e não apenas pontificar - sobre temas importantes, como tráfico de drogas, política energética, integração econômica e imigração.

Com Fidel Castro praticamente fora do cenário político, Washington deveria testar as intenções dos novos líderes cubanos. Acreditamos que a melhor maneira de fazer isto seria levantando o embargo econômico, que deu a Fidel e a seus colegas uma desculpa interminável para seus erros e iniqüidades.

Durante a campanha, Obama infelizmente concordou com a proposição incorreta (mas politicamente conveniente) de que o embargo fortalece os Estados Unidos. Felizmente, ele disse também que iniciaria um processo de recuperar Havana para os EUA - e de abertura de Cuba aos ventos da mudança -, levantando as restrições às viagens e às remessas de dinheiro para a ilha.

Deveria fazer isto sem perda de tempo.

A queda dos preços do petróleo e o declínio da projeção do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, facilitarão o trabalho de Obama.

Não temos mais paciência com os métodos corruptos e autocráticos de Chávez. Entretanto, o governo Bush causou enormes prejuízos à credibilidade americana em grande parte da região, quando deu sinal verde para o golpe fracassado contra Chávez.

O líder venezuelano apostou nos sentimentos antiamericanos por tudo que representam. E gastou uma boa parte das abundantes riquezas petrolíferas da Venezuela para fortalecer os irmãos Castro e financiar um amplo bloco antiamericano. Agora, já não tem tanto dinheiro para distribuir. E seus compatriotas perderam a paciência com sua revolução fracassada.

O declínio de Chávez suscita também novos desafios. As finanças de Cuba, assim como as de Argentina, Nicarágua ou Honduras poderão se deteriorar rapidamente se a Venezuela decidir reduzir as entregas de petróleo barato e os bilhões em ajuda. O governo de Washington deve estar preparado para ajudar, quer com recursos próprios quer com o apoio de agências de crédito internacionais.

Será preciso engolir remédios amargos. Para o bem das empresas americanas e da credibilidade dos Estados Unidos, o Congresso terá de aprovar o acordo de comércio com a Colômbia.

Outras medidas talvez venham mais facilmente. Washington deveria inaugurar um diálogo regional sobre o narcotráfico e provar que pode contribuir para combater o comércio de armamento com o Sul e reduzir internamente a demanda de drogas.

Quanto à energia, a eliminação das tarifas sobre as importações de etanol contribuiria para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis e melhoraria consideravelmente as relações com o Brasil.

Os Estados Unidos precisam dar continuidade à reforma da imigração. Também devem dar início a discussões regulares sobre as questões da migração com os países que enviam estes imigrantes. Isto seria crucial para melhorar as relações e encontrar soluções para problemas cruciais como as violações dos direitos humanos contra os imigrantes.

Se ainda há dúvidas quanto à necessidade de uma nova política para a região, consideremos os seguintes fatos: a América Latina fornece um terço do petróleo que os Estados Unidos importam, bem como a maior parte dos imigrantes e praticamente toda a cocaína que entra no nosso país. E é nossa vizinha.

sábado, 29 de novembro de 2008

A identidade cultural e a decisão judicial na Espanha

Dando continuidade a postagem do problema de identidade cultural na Espanha revelado no caso do crucifixo, o jornal "El País" noticia em 29 de novembro de 2008 a respeito do hasteamento da bandeira espanhola no parlamento vasco. Sublinhem-se as contribuições de Rudolf Smend e, mais recentemente, de Peter Häberle (veja a entrevista dele postada em www.supremoemdebate.blogspot.com sobre o tema) em obra abordando essa questão da identidade cultural publicada no Brasil.

El Supremo ordena que la bandera de España ondee en el Parlamento vasco
El tribunal cierra un contencioso que inició el delegado del Gobierno en 2002


La bandera de España deberá ondear diariamente en el exterior del Parlamento vasco y ocupar un lugar preferente en el interior, según ordena una sentencia del Tribunal Supremo que confirma otra anterior del Tribunal Superior de Justicia del País Vasco. La sentencia ratifica que la expresión "deberá ondear" pone de relieve la exigencia legal de que la bandera de España ondee "todos los días", como símbolo de que en los edificios de las Administraciones públicas del Estado "se ejerce, directa o delegadamente, la soberania”.
El Tribunal Supremo se remite a la ley 39/1981 que regula el uso de la bandera y demás enseñas y dice que ésta "no admite interpretaciones que excusen el cumplimiento del deber de hacer ondear diariamente la bandera de España en el exterior y en el lugar preferente en el interior del Parlamento vasco".
El recurso de la Cámara vasca alegaba que la bandera española llevaba 20 años sin ondear en el Parlamento de Vitoria y que el requerimiento se había presentado fuera de los plazos establecidos.
Frente a estos alegatos, el Supremo explica que la no aplicación de una norma no la lleva a su desuso, ya que, en modo alguno, la costumbre puede prevalecer sobre la ley. Además, aceptar que las leyes se derogan "por el simple transcurso del tiempo acompañado de su incumplimiento" implicaría una ruptura del principio de legalidad.
En definitiva, el Supremo reitera que la bandera de España deberá ondear en el edificio del Parlamento vasco, "diariamente", "con carácter de permanencia, no de coyuntura, no de excepcionalidad, sino de generalidad", y "en todo momento".
El alto tribunal concluye explicitando "la firmeza de la sentencia" y "la vigencia del criterio que se sostiene en ella". El fallo condena en costas al Parlamento vasco, aunque limita a 3.000 euros la cifra máxima de honorarios del letrado del Estado.
La sentencia del Supremo, de la que ha sido ponente el magistrado Octavio Juan Herrera, pone fin al contencioso iniciado en mayo de 2002, cuando el delegado del Gobierno en la comunidad autónoma vasca requirió el cumplimiento de la ley de banderas. El requerimiento no fue contestado por el Parlamento vasco, decisión que recurrió el abogado del Estado en representación de la Administración central.
La bandera de España, la ikurriña y la enseña de la UE lucen desde hace tiempo en la sala de recepciones del Parlamento vasco. Pero no en el exterior del edificio, donde no ondea bandera alguna.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Faoro e o Estado brasileiro

A "Folha de São Paulo" de 27 de novembro de 2008 noticia os 50 anos de publicação da importante obra de Faoro para compreender o Estado brasileiro. O ex-presidente do Conselho Federal da OAB é autor, também, da obra Assembléia Constituinte revisitada. A obra com 50 anos de publicação só veio a ser descoberta com o Golpe Militar de 1964 que demonstrou o acerto da visão interpretiva de Faoro sobre a realidade brasileira e o seu estado patrimonialista.Clássico de Faoro completa 50 anos com nova edição"Os Donos do Poder", obra que analisa o caráter patrimonialista do Estado brasileiro, será tema de debate, hoje à noite, na FGV Na época em que escreveu uma das mais importantes interpretações do país, Raymundo Faoro era jovem e obscuro advogado no RS. Do esforço e da erudição individual de um obscuro advogado gaúcho, uma espécie de "self-made man" da análise sociológica, nasceu, há 50 anos, uma das mais importantes interpretações sobre o Brasil. Leitura que dizia, justamente, que o Estado patrimonialista sufocava aventuras ou empreendimentos independentes, impedindo o surgimento de ideário e práticas modernas, liberais no país. O hoje clássico "Os Donos do Poder - Formação do Patronato Político Brasileiro", de Raymundo Faoro (1925-2003), escrito à mão em 1954, só veio a ser editado em 1958, pela então gaúcha editora Globo. Ganhará agora uma nova edição, que chega às livrarias nesta semana, com comentário crítico do professor de ciência política da USP Gabriel Cohn e reprodução de manuscritos. Conta Cohn que "o livro talvez não tivesse vencido a muralha da indiferença" se não ocorresse a alguém na editora -"consta que Erico Verissimo"- sintetizar o argumento com um título novo, a partir do próprio texto de Faoro. E quem são esses celebrizados "donos do poder"? São representantes de um Estado que confunde coisa pública e privada, um "estamento" burocrático que não tira seu poder da representação de grupos ou interesses econômicos e sociais independentes da máquina estatal, mas, ao contrário, que constitui riquezas privadas e fortalece grupos a partir das posições que ocupam no Estado. Herança e mudançaPara o autor gaúcho, que viria a ser figura de frente na luta pela redemocratização do país durante a ditadura militar (1964-1985), o Brasil herdou de Portugal uma organização política pré-moderna, em que o Estado capitaneia os grandes empreendimentos comerciais, sufocando a existência de uma burguesia autônoma, limitando e canalizando todos os impulsos da sociedade. É verdade, no entanto, que o país mudou bastante desde a publicação da primeira edição do livro. A democracia ganhou força e representatividade. Como fica o patrimonialismo hoje no Brasil? Para o advogado e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr., o argumento permanece atual. "O poder ainda emana daquele que tem a caneta", ele diz. "Segundo Faoro, o poder não estava no dinheiro, no empresariado, no poder social, mas na capacidade de nomear pessoas, alocar conhecidos e distribuir benesses. Isso continua valendo." Já Gabriel Cohn defende que a conclusão principal do livro de Faoro continua válida apenas se considerarmos que essa forma geral do Estado patrimonialista é extremamente "plástica", adaptando-se sempre a novas realidades. A leitura é possível, mas o advogado sugere rigidez maior em sua tese, como alerta o próprio Cohn. "O que não dá para sustentar é a idéia de uma asfixia total sobre a sociedade. Você tem uma sociedade tolhida na sua capacidade de constituir seus próprios dinamismos, mas a idéia de uma sociedade asfixiada [pelo Estado] não se mantém." Cohn e Reale Jr. participam hoje à noite, na Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (r. Rocha, 233), de um debate sobre Faoro e "Os Donos do Poder". Também participarão da mesa o advogado e cientista político Oscar Vilhena e o historiador Carlos Guilherme Mota. O encontro acontece às 19h, e a entrada é gratuita.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Democracia indiana e minorias

Sob o contexto da recente onda terrorista verificada na Índia, aFolha de São Paulo publica matéria na qual é analisada a posição das minorias étnico-religiosas na democracia indiana.


Minorias sem voz tornam democracia indiana explosiva

27/11/2008

João Batista Natali, colaboração para a Folha

A Índia está tão vulnerável aos rabichos de sua cisão com o Paquistão, em 1947, que raramente é lembrada a presença de grupos radicais islâmicos capazes de provocar grandes estragos naquela que os britânicos, por critério demográfico, insistem em chamar de "a maior democracia do mundo".
Os atentados de ontem, que fizeram ao menos 86 mortos e 250 feridos, dão uma imagem bem mais temperada da democracia indiana. De alguma forma, ela não abre espaço para que minorias, mesmo radicais e sem a vocação democrática, possam se manifestar.
Não está aparentemente em xeque a questão da Caxemira, região indo-paquistanesa de maioria islâmica e entregue em grande parte à soberania da Índia quando da divisão do antigo território colonial britânico.
O que os grupos terroristas agora mostram é que eles têm uma lógica própria, independentemente de uma reivindicação territorial. Há obviamente a questão da Caxemira. Mas há também a tentativa de desestabilização do regime indiano por meio de supostos porta-vozes de uma minoria étnica e religiosa. Não é algo historicamente inédito. Atentados anteriores em Mumbai, sobretudo em julho de 2006, mataram 190 pessoas e feriram cerca de 700.
O que está em jogo não é a questão puramente étnica. É o problema religioso. Apesar de uma produção econômica próxima à do Brasil e uma população seis vezes maior, a Índia é um poço de diversidade em que as minorias não encontraram seu lugar ou não consideraram que o pluralismo democrático lhes ofereça um nicho para expressarem suas reivindicações.
É claro que os grupos radicais islâmicos encontram nesse caldo de cultura um ambiente excepcional de atuação. E é também inevitável que -a exemplo dos argumentos do governo indiano em séries anteriores de atentados terroristas- o Paquistão seja apontado como um cúmplice direto. Ele é o porta-voz histórico do islamismo naquela região da Ásia. Mantém uma relação ambígua com o Taleban, no Afeganistão, e de certo modo cobrou dos EUA por um trabalho que não fez na chamada "guerra ao terrorismo" do governo Bush.
Mas o problema não é essencialmente externo. Uma potência estrangeira, por mais sofisticados que sejam seus serviços de inteligência, não conseguiria atingir tantos alvos simultâneos. É necessária uma ampla cumplicidade interna. A Índia é um caldeirão étnico e religioso no qual o crescimento econômico não beneficia de forma equânime todos os extratos da população -religiosos, de castas ainda existentes. A segregação dá margem ao descontentamento, e minorias marginalizadas têm na violência opção.
Os atentados de ontem à noite foram um novo exemplo da intolerância religiosa. O modelo que tem como exemplo a Al Qaeda possui como vertente a cegueira política com relação ao "outro" na escala étnica e demográfica. Ou seja, uma concepção em que a verdade fabricada segundo padrões excludentes serve de motor para as mais absolutas barbaridades.
Mais uma vez aconteceu. E novamente atingiu a Índia, que, se não é exemplar, ao menos possui um modelo político que traz como herança positiva aquele recebido pelos antigos colonizadores europeus.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Nicarágua e o autoritarismo de Ortega

O jornal espanhol El País publica, no dia 26 de novembro de 2008, um artigo sobre a atual situação política da Nicarágua e sobre a trajetória de Daniel Ortega rumo ao poder.


Nicaragua: de revolución a farsa

A quienes siguieron con admiración la conquista del poder por los sandinistas les sorprende hoy la deriva autoritaria y neobíblica de Daniel Ortega. Sin embargo, oscuros episodios jalonan toda su trayectoria política

GIOCONDA BELLI

Para defender los fraudulentos resultados de las recientes elecciones municipales del 9 de noviembre en Nicaragua, Daniel Ortega no encontró mejor salida que instaurar la anarquía en varios sitios del país. Para acallar las protestas de la población al conocerse las evidencias del fraude, mandó a sus seguidores para que impidieran con lluvias de piedras y amenazas de palos que ésta se manifestara.

Para quienes siguieron de cerca la Revolución Sandinista en los años 80, resulta difícil entender lo que sucede. Figuras emblemáticas de aquellos años, como Ernesto Cardenal, Dora María Téllez, Sergio Ramírez, han denunciado que en el país se está gestando otra dictadura. A menudo, he comprobado el desconcierto de quienes apoyaron con su solidaridad lo que semejaba entonces una gesta de David contra Goliat. Preguntan sorprendidos: ¿qué le ha pasado a Daniel Ortega? ¿Cómo fue que cambió tanto? Confieso que me da un poco de vergüenza responderles. Para muchos de los que formamos parte de aquella masa intrépida que derrocó a la tiranía somocista el 19 de julio de 1979, los bandazos y arbitrariedades de Ortega eran un secreto a voces que guardábamos en casa. Atribuíamos ese comportamiento a su falta de experiencia, al poco don de gentes de su inescrutable personalidad, al impacto psicológico de los siete años que pasó en la cárcel. Lo aclamábamos en medio del fervor idealista, pero en la intimidad criticábamos su constante necesidad de ser desafiante sin medir las consecuencias. Nuestro consuelo era saber que, aunque el mundo lo considerara el líder de la revolución, en realidad él era solamente uno más.

La dirección del Frente Sandinista de Liberación Nacional (FSLN) y del Gobierno revolucionario era colectiva y varios de los nueve hombres que conformaban el directorio eran personas capaces e ilustradas cuya autoridad era un contrapeso a la peculiar manera del presidente de hacer política. Recuerdo incluso una conversación que sostuve, antes del triunfo de la revolución nicaragüense, con Fidel Castro. Cuando le reclamé su aparente preferencia por la facción dirigida por los hermanos Ortega, Humberto y Daniel -el FSLN se encontraba dividido entonces en tres grupos-, Fidel me contestó diciendo que precisamente porque las ideas y la disposición de los Ortega era menos predecible, él consideraba que no podía dejarlos solos. No sé qué pensará Fidel ahora.

La supremacía de Daniel Ortega entre aquel grupo de primus inter pares fue asentándose gracias, en gran medida, al poder indiscutible que la llamada Guerra de la Contra, confirió a su hermano, Humberto, el comandante en jefe del Ejército Popular Sandinista. Más astuto que Daniel, su habilidad para salirse con la suya a cualquier costo le había ganado el sobrenombre de Puñal. Durante los 10 años que duró la Revolución, Humberto Ortega fue inclinando el fiel de la balanza a favor de su hermano hasta asignarle un protagonismo que justificaba con el argumento de que la autoridad de un presidente confería institucionalidad a la revolución. Ni él mismo, creo, imaginó lo aventajado que resultaría su hermano como aprendiz de sus mañas.

Paradójicamente, la hora más alta de Daniel Ortega no sobrevino en ninguno de sus momentos de triunfo, sino ante la inesperada derrota del FSLN en las elecciones de 1990, las más vigiladas en la historia del país. En el discurso en que concedió la victoria a su contrincante, Violeta Chamorro, destacó la trascendencia de aceptar la voluntad popular, aun cuando la guerra financiada por Ronald Reagan, hubiese puesto al pueblo de Nicaragua a votar con una pistola en la sien. No quedó ojo seco entre quienes lo escuchaban, fuera por tristeza o por alivio. Al día siguiente, sin embargo, Ortega cambió su tono conciliador y ante una azorada multitud prometió "gobernar desde abajo".

El debate sobre lo que esto significaba para un FSLN en la oposición fue el origen de la primera gran fractura interna del sandinismo. Ortega y tras él las disciplinadas estructuras partidarias reclamaban que jamás renunciarían al derecho a ejercer la violencia "revolucionaria", que hacerlo era traicionar al pueblo. La otra posición planteaba que el partido debía adaptarse a las nuevas condiciones del mundo. La caída del bloque socialista demostraba el fracaso de la "dictadura del proletariado". El país requería una izquierda moderna que descartara la violencia como método de resolver diferencias y se apuntara con brío a radicalizar la democracia y abogar por los intereses populares respetando la diversidad y las leyes.

Las acusaciones de los sectores más dogmáticos contra quienes sosteníamos estas ideas no se hicieron esperar. A los disidentes se nos endilgaron adjetivos que iban desde cobardes hasta traidores. Daniel Ortega dirigió la embestida y se erigió como el único capaz de preservar la amenazada unidad. Renovó así el discurso de confrontación de los años 80, esta vez contra los miembros de su propio partido. Mientras tanto, en la práctica, él y otros dirigentes como Bayardo Arce y Tomás Borge, se encargaban de asegurar la supervivencia económica del FSLN y de ellos mismos, distribuyendo propiedades del Estado y otros recursos y acumulando fortunas personales.

La llamada piñata sandinista fue vergonzosa. Si bien la propiedad de la tierra fue legalizada a las cooperativas, en un acto de democratización del área propiedad del pueblo compuesta por los bienes confiscados a Somoza y la dictadura, cuadros sandinistas alertados sobre el valor de estas tierras, las compraron a los cooperados y pasaron a ser dueños, entre otras cosas, de las anchas costas del Pacífico nicaragüense que hoy son vendidas a inversores europeos y norteamericanos por millones de dólares. La piñata causó nuevas deserciones en el interior del FSLN por desacuerdos éticos, pero generó, al mismo tiempo, complicidades estrechas ya no basadas en ideales y sueños, sino en negocios o en el mutuo encubrimiento. El FSLN se apropió de emisoras de radio y equipos de televisión. Fundó un banco y formó empresas usando los nombres de cuadros leales que también se enriquecieron.

Esta incursión en el mundo de los negocios no impidió, sin embargo, que continuara el discurso populista. Y fue este divorcio entre el discurso y la práctica lo que, en 1999, le permitió pactar la división del país con el entonces presidente y jefe máximo del Partido Liberal Constitucionalista, Arnoldo Alemán. Acusado de corrupción, Alemán se encontraba en una posición de debilidad. Para asegurar su supervivencia política aceptó el pacto con Ortega. Se amplió el número de magistrados y miembros de la Corte Suprema, del Consejo Electoral, de la Contraloría, de la Asamblea Nacional para incluir a los sandinistas y se inició un cogobierno. Eventualmente, Ortega le arrancó a Alemán la concesión clave: bajar el porcentaje de votos necesario para ser electo presidente de un 45% a un 35%.

Hecho esto, Ortega escenificó el regreso del hijo pródigo a los brazos de la Iglesia católica, a quien atribuía una influencia decisiva en sus previas derrotas electorales. Empezó a visitar a su antiguo némesis, el cardenal Miguel Obando y Bravo. Poco después, éste ofició la misa en que el líder sandinista se casó por la iglesia con su compañera de vida, Rosario Murillo (cuya hija lo acusó en 2003 de abuso sexual desde los 11 años), y sus discursos se llenaron de frases bíblicas y alabanzas a Dios. Como ofrenda final, Ortega apoyó la revocación de una disposición constitucional del siglo XIX que autorizaba la interrupción del embarazo si hacía peligrar la vida de la madre.

Tras tres intentos fallidos, el tozudo comandante logró coronar su ambición de regresar a la presidencia el 10 de enero de 2006, al alcanzar una votación del 38%. Su actitud desde entonces y en las recientes elecciones municipales parece indicar que esta vez no está dispuesto a jugarse el poder más que en simulacros democráticos cuyos resultados le favorezcan.

Mientras escribo esto, la carretera de acceso a mi casa está cortada por grupos de choque orteguistas. Apostados allí, intentan impedir que medios y diplomáticos lleguen a una iglesia donde Eduardo Montealegre, el candidato a alcalde de Managua por la oposición, mostrará las actas de votación que demuestran el fraude perpetrado en su contra. Aparentemente, para salirse con la suya, Daniel Ortega también está dispuesto a incendiar el país. Lo mismo hizo Somoza en 1979. El revolucionario se ha convertido en su propia antítesis.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Como superar a crise

O jornal Valor Econômico, do dia 25 de novembro de 2008, publica artigo de Jeffrey Sachs sobre a necessidade de cooperação global para a superação da crise financeira.


Uma recuperação sustentável

Jeffrey Sachs

A recessão mundial ora em curso é o resultado não somente de um pânico financeiro, mas também de incertezas mais básicas sobre a futura direção da economia mundial. Os consumidores estão se abstendo de comprar moradias e automóveis não apenas porque sofreram um impacto redutor em sua riqueza devido à queda nos preços das ações e nos valores das moradias, mas também porque não sabem para onde ir. Deveriam eles apostar na compra de um carro novo se o preço da gasolina pode disparar novamente? Terão eles condições de pôr comida na mesa após o aterrador aumento nos preços dos alimentos neste ano?
As decisões sobre investimentos empresariais são ainda mais graves. As empresas estão relutantes em investir, num momento em que a demanda do consumidor está desabando e estes se defrontam com penalidades de risco sem precedentes sobre custos na tomada de empréstimos. Eles estão também defrontando-se com enormes incertezas. Que tipos de usinas de eletricidade serão aceitáveis no futuro? Terão elas permissão para emitir tanto dióxido de carbono quanto no passado? Poderão os EUA continuar a arcar com os custos de um estilo de vida suburbano, com grandes residências em bairros distantes que exigem longas viagens casa-trabalho?
Em larga medida, a recuperação econômica dependerá de uma percepção muito mais clara do rumo das futuras mudanças econômicas. Isso é fundamentalmente incumbência do governo. Após a confusa e equivocada liderança do governo Bush, que não sinalizou nenhum caminho claro nos setores de energia, saúde, clima, e políticas financeiras. O presidente eleito Barack Obama terá de começar a plotar um curso que defina a direção futura para a economia americana.
Os EUA não são a única economia nessa equação. Necessitamos uma visão global de recuperação sustentável que inclua os líderes na China, Índia, Europa, América Latina e, sim, até mesmo da África, há muito marginalizada da economia mundial, mas que agora constitui grande parte dela.
Existem poucos pontos claros em meio a grandes incertezas e confusões. Em primeiro lugar, os EUA não podem continuar a tomar emprestado do resto do mundo como nos últimos oito anos. As exportações líquidas dos EUA terão de crescer, o que significa que, em conseqüência, as exportações líquidas da China, do Japão e de outros países superavitários diminuirão. Os ajustes necessários equivalem a uma substancial reversão na relação déficit/superávit da conta corrente americana - em torno de US$ 700 bilhões, ou quase 5% do Produto Nacional Bruto (PNB).
O superávit comercial chinês poderia ser reduzido em 50% daquele montante (com cortes em superávits comerciais também distribuídos por outras regiões do mundo), o que significaria uma guinada para o PNB chinês - mais focada na demanda interna e mais distante das exportações líquidas -, igual a 5% a 10% do PNB chinês. Felizmente, a China está promovendo uma grande expansão interna.
Em segundo lugar, o declínio no consumo americano deveria também ser parcialmente contrabalançado por um crescimento dos investimentos nos EUA. Entretanto, as empresas privadas não intensificarão seus investimentos, a menos que haja uma direção política clara para a economia. Obama enfatizou a necessidade de uma "recuperação verde", ou seja, uma retomada baseada em tecnologias sustentáveis, e não simplesmente em gastos com consumo.
A indústria automobilística americana precisa ser reformulada de modo a produzir carros que produzam emissões com baixo teor de carbono, sejam híbridos ou veículos movidos unicamente a baterias. Tanto uma como a outra dessas tecnologias dependerá de uma rede nacional de eletricidade que empregue formas de geração de eletricidade que produzam baixas emissões, como eólica, solar, nuclear ou a carvão que capturem e armazenem as emissões de dióxido de carbono. Todas essas tecnologias exigirão financiamento público ao lado de investimento privado.
Em terceiro lugar, a recuperação americana será crível somente se houver também uma estratégia para repor em ordem as finanças do próprio governo. A concepção de política econômica de George W. Bush foi cortar os impostos três vezes, ao mesmo tempo em que aumentou os gastos bélicos. O resultado é um enorme déficit orçamentário que explodirá para proporções descomunais no ano que vem (possivelmente para US$ 1 trilhão) sob o peso adicional de recessão, socorro a bancos e medidas de estímulo fiscal de curto prazo.
Obama precisará apresentar um plano fiscal de médio prazo que recomponha as finanças governamentais. Isso incluirá o fim da guerra no Iraque, elevar os impostos sobre os ricos e também instituir gradualmente novos impostos sobre o consumo. Os EUA atualmente arrecadam a menor proporção de impostos sobre a renda nacional entre os países ricos. Isso terá de mudar.
Em quarto lugar, as regiões pobres do mundo precisam ser vistas como oportunidades de investimento, e não como ameaças ou lugares a ser ignorados. Num momento em que as maiores empresas de obras de infra-estrutura dos EUA, Europa e Japão terão graves excessos de capacidade, o Banco Mundial, o Banco Europeu de Investimentos (BEI), o Banco de Fomento à Exportação-Importação (Eximbank) dos EUA, o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) e outros fundos de investimento estatal deveriam financiar grandes gastos com infra-estrutura na África - para construir rodovias, usinas de eletricidade, portos e sistemas de telecomunicações.
Se os créditos forem de longo prazo e implicarem juros moderados (digamos, empréstimos em dólar por 25 anos a 5% ao ano, os países beneficiários poderiam honrar esse endividamento com base no considerável incremento das rendas resultante no curso de uma geração. Os benefícios seriam extraordinários, tanto para a África como para os países ricos, que assim colocariam suas empresas e mão-de-obra especializada de volta em ação. Esse tipo de empréstimo, naturalmente, exigiria uma ampla iniciativa mundial, num momento em que até mesmo companhias de primeiríssima linha não conseguem tomar empréstimos no curtíssimo prazo, muito menos por 25 anos!
Em ciclos econômicos típicos, os países geralmente administram sua recuperação fundamentalmente por conta própria. Desta vez, necessitaremos cooperação mundial. A recuperação demandará importantes mudanças em desequilíbrios comerciais, tecnologias e orçamentos governamentais.
Essas mudanças de larga escala terão de ser coordenadas, pelo menos informalmente, se não rigidamente, entre as principais economias. Cada uma delas precisará compreender as direções básicas de mudança que serão necessárias em nível nacional e mundial, e todos os países precisam compartilhar a mobilização de novas tecnologias sustentáveis e a implementação do financiamento conjunto das responsabilidades mundiais, como o incremento dos investmentos em infra-estrutura na África.
Chegamos a um momento na história em que liderança política mundial cooperativa é mais importante do que nunca. Felizmente, os EUA deram um enorme passo à frente, com a eleição de Obama. Agora, à ação.

Jeffrey Sachs é professor de Economia e diretor do Instituto Terra, na Universidade Colúmbia.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

China e democracia

O Jornal do Brasil trouxe, no dia 23 de novembro de 2008, entrevista de David Guthrie sobre o futuro da China ruma à democracia.


Silenciosa revolução rumo à democracia

ENTREVISTA
DAVID GUTHRIE
Autor de China e Globalização e professor de economia da Universidade de Nova York, David Guthrie vê a democracia na China como passo inevitável, e defende a tese de que o país já vem desenvolvendo instituições democráticas progressivamente, sem rotulá-las como tal. Por isso, mudanças na China têm sido mais dramáticas do que muita gente percebe. Acontecem sem alarde, no que chama de uma revolução silenciosa.
Qual o segredo do sucesso eco- nômico da China nos últimos 30 anos?
­ Entendo que as reformas eco- nômicas na China têm cinco categorias essenciais. Primeiro, a que chamo de gradualismo. O grande contraste a este fenômeno seriam os países do antigo bloco soviético que fizeram uma rápida transição do comunismo à propriedade privada, porque economistas lhes disseram que tinha de ser assim para que pudessem desenvolver uma economia robusta. A China não seguiu este caminho, mas foi tateando pedras até atravessar o rio. Economistas afirmam que a propriedade privada é o fundamento de um sistema de mercado, mas a China demonstrou que o Estado pode criar incentivos apropriados que a substituam. A segunda categoria é a descentralização. Embora Pequim tenha guiado as reformas, permitiu que as províncias tomassem as rédeas sobre suas próprias reformas. A terceira é a abertura da China para o investimento direto estrangeiro. A quarta é a iniciativa privada que foi surgindo de baixo para cima, em vez de depender somente de uma economia controlada pelo Estado, ou seja, de cima pra baixo. A quinta e última é que essa abordagem gerou também mudanças políticas e jurídicas, em uma revolução tranquila e silenciosa.
E a corrupção do partido, não atrapalha?
­A questão da corrupção é com- pletamente exagerada. Há corrupção, mas em níveis exatamente de se esperar neste estágio do desenvolvimento do país. É importante frisar que o sistema legal chinês existe há apenas 30 anos e mesmo assim, o país está bem melhor que a Rússia, por exemplo. Acho que os EUA enfatizam demais a corrupção por não se sentirem confortáveis com governos autoritários.
As reformas mudaram o par- tido?
­ Sem dúvidas. A ala liberal do partido está no poder e vem impulsionando reformas democráticas agressivamente. Desafiaria qualquer um a fazer uma lista de valores democráticos e comparar a China de 1979 com aquela de hoje. Ninguém diria que ela não é mais democrática hoje do que era há 30 anos. A liberação política integral é apenas uma questão de tempo. Oito anos atrás, não se podia acessar o site do New York Times no país, por exemplo, hoje o Estado já permite isso.

Direitos humanos e crise global

Notícia do Valor Econômico do dia 24 de novembro de 2008 faz referência ao impacto que os direitos humanos podem sofrer com a crise financeira global.


Brasil quer debater na ONU impacto da crise global nos direitos humanos

Assis Moreira, de Genebra

O Brasil está propondo a realização urgente na Organização das Nações Unidas (ONU) de um painel para examinar o impacto da crise financeira sobre os direitos humanos, refletindo a dimensão de problemas que se acumulam.

"Precisamos chamar a atenção para o respeito de direitos concretos econômicos e sociais das pessoas, e ao mesmo tempo evitar que temas de direitos humanos sejam seqüestrados por interesses comerciais específicos em áreas como saúde, trabalho e meio ambiente", diz a nova embaixadora brasileira na ONU em Genebra, Maria Nazareth Farani Azevedo.

A ação brasileira coincide com repetidas advertências do economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Olivier Blachart, de que o pior da crise financeira "ainda está por acontecer".

O Brasil sinaliza preocupação, por exemplo, de que o aprofundamento da crise leve alguns governos a aplicar políticas mais restritivas sobre migrantes. A representante brasileira destaca estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de que a crise pode provocar 20 milhões de desempregados até o fim de 2009, elevando o número de trabalhadores pobres vivendo com menos de US$ 2 por dia, na linha da pobreza.

Também a queda de remessa de dinheiro de migrantes será significativa, com impacto no orçamento de vários países. O Banco Mundial previa remessas globais de US$ 283 bilhões este ano. Com a crise, a redução pode ser de 6% no montante, já este ano, e mais em 2009 no auge da recessão.

Outra preocupação da missão brasileira na ONU é de que os países desenvolvidos doadores, obrigados a apertos orçamentários na crise, diminuam substancialmente suas contribuições a programas de saúde em nações em desenvolvimento. "Aí será um desastre ainda maior, porque em alguns países mais pobres os gastos per capita com a saúde não passam de US$ 16 por ano, comparados a US$ 2.300 nas nações industrializadas", observa a embaixadora.

Além disso, o Brasil aumentou a vigilância sobre tentativas de alguns países aproveitarem a crise global para levar adiante certas agendas políticas, embutindo intenções comerciais nas áreas de saúde, trabalho e meio ambiente. A embaixadora exemplifica com a questão ambiental e dá o alerta: "Proteger o meio ambiente é importante, mas custa caro. Estamos atentos para não pagarmos custos desnecessários."

O Brasil reagiu recentemente a posições do relator da ONU para o Direito à Alimentação, o belga Olivier De Schutter, que acusou a produção de biocombustíveis de tomar o espaço para produção de alimentos, explorar a terra de maneira inadequada e atropelar direitos dos pobres a comida. Ele não mencionou, porém, uma só vez as conseqüências dos subsídios agrícolas, que deprimem os preços internacionais, tiram do mercado produtores de países em desenvolvimento e ampliam a pobreza, reage a embaixadora.

Na prática, o Brasil procura dar nas Nações Unidas uma abordagem mais ampla ao tema de direitos humanos. A estratégia inclui uma participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2009, de uma sessão sobre o tema.

"O Conselho de Direitos Humanos deve ir além das denúncias e confrontos políticos e buscar uma agenda positiva. Só podemos proteger os direitos humanos com diálogo, convencimento e consenso", diz a embaixadora Maria Nazareth.

Nesse contexto, o Brasil negocia com o Alto Comissariado de Direitos Humanos um acordo para prestar cooperação Sul-Sul com países interessados. A missão brasileira em Genebra está criando estágios para estudantes brasileiros, para se especializarem em direitos humanos. Vai colocar funcionário num programa para profissionais "júnior" no Alto Comissariado. E para contribuir para o sistema da ONU, o país está colocando um assessor à disposição do presidente do Conselho de Direitos Humanos, um nigeriano. Para a diplomacia, a estratégia mais ativa no nível internacional deve reforçar a proteção dos direitos humanos internamente.

domingo, 23 de novembro de 2008

A neomodernidade - a volta do Estado?

O jornal "EL Páis" de 23 de novembro de 2008 publica este texto abaixo vendo a volta do Estado. É importante proceder a leitura tendo acesso, também, a revista Constellations em www.capes.gov.br - portal capes.

¡Bienvenidos a la neomodernidad!
La posmodernidad ha muerto. Con la crisis termina el culto al caos, el individualismo y lo identitario. Vuelve el Estado, el mejor gestor del orden, la seguridad y la estabilidad, así como de la igualdad y la protección social
FERNANDO VALLESPIN


Toda crisis, y ésta parece ser de las más profundas, introduce una importante cesura en el tiempo histórico. Nunca es un corte drástico, desde luego, siempre hay elementos de lo viejo que siguen perviviendo en lo nuevo. Pero sí sirven al menos para hablar de un antes y un después. Y creo que esto es lo que va a ocurrir con esta nueva crisis. La gran cuestión es si somos capaces de anticipar los rasgos básicos de la sociedad que viene, si podemos saber en qué se diferenciará de lo ya conocido. Tengo para mí que la sociedad del futuro inmediato abandonará algunos de los rasgos más conspicuos de eso que hemos venido calificando como posmodernidad para volver a muchos de los de la anterior fase moderna sin que ello signifique un pleno retorno a ella. Será una novedosa y curiosa síntesis de presupuestos modernos bajo las condiciones objetivas de una sociedad global y mucho más compleja, una neomodernidad. Especulemos.
En la nueva era, orden y seguridad, asociados a bien común y solidaridad, pueden tomar la delantera
Las políticas de izquierdas que propongan un nuevo contrato social tienen una gran oportunidad
El rasgo más marcado del cambio, ya lo estamos viendo, es el renovado protagonismo de la economía. Frente a la prioridad que en la anterior fase posmoderna acabó teniendo lo cultural -en un sentido lato-, se alza ahora lo económico como el factor central de la actividad humana. Por el momento, habrá que arrinconar tesis como la de Huntington, que creía ver en lo identitario-cultural la esencia del conflicto contemporáneo. Tanto en la dimensión política global como en la interna, los conflictos en torno a la distribución de los recursos pasarán al centro del interés y se postergarán los identitarios. La redistribución, la lucha contra la desigualdad, volverá a dominar el debate político después de haber sido durante décadas la gran cuestión olvidada. Regresarán los clásicos conflictos sociales con raíz de clase y es previsible imaginar una reverdecida presión para alcanzar una mayor equidad fiscal. ¿Cómo justificar ahora, por ejemplo, ante la nueva menesterosidad, el escapismo fiscal de que han venido disfrutando los más privilegiados? No deja de ser irónico que la elección de Obama, que representa un hito en las "luchas por el reconocimiento" posmodernas -de minorías étnicas en este caso-, acabe por significar la afirmación de políticas de igualdad frente a las de la "diferencia".
Valores como solidaridad, igualdad, autoridad, esfuerzo, responsabilidad, cotizarán al alza. Los clásicos valores densos de nuestra herencia moderna postergarán a los más ligeros -líquidos, en la jerga de Bauman- del "todo vale", la gratificación inmediata, el hiperconsumo, la autorrealización individual. No saldremos de eso que los sociólogos califican como "individualización", pero habrá una tendencia a moderar el individualismo y el privatismo radicalizado en aras de un mayor compromiso con los objetivos sociales generales. Todo ello en nombre del gran valor de la modernidad: el orden. Lo ambivalente, ambiguo, relativo, esos rasgos esenciales del pluralismo posmoderno, serán mirados con sospecha. Orden y seguridad, asociados a bien común y solidaridad, tienen garantizada buena prensa en momentos en los que acucia la necesidad y el miedo. El gran gestor del orden, la seguridad y la estabilidad, pero también de la protección social más general, ha sido siempre el Estado, el héroe de la modernidad clásica. Parece obvio que volverá a gozar de una renovada legitimidad. Un Estado al que seguramente se le exigirá mucho más de lo que está en condiciones de dar. Pero será el gran protagonista de los tiempos venideros.
A la vista del actual agotamiento de los procesos de integración regional y de la afirmación de los nuevos Estados emergentes, la política de la nueva sociedad global se sujetará más a la clásica pauta de la colaboración "inter-nacional" que a la gobernanza "transnacional" propiamente dicha. "Gobernanza entre Estados" y geopolítica clásica. Es un craso error en momentos en los que mandan las interdependencias y la solución de problemas pasa por poner en común importantes dimensiones de la soberanía (sovereignty pooling).
Ad intra el Estado garantizará también medidas que calmen la ansiedad ante la inmigración, más fronteras, mayores garantías de los intereses nacionales, menor predisposición a tolerar los mecanismos de autoorganización social. Vuelta al big government y a las certidumbres locales, a la tentación de reafirmar el egoísmo de país, la razón de Estado, el paternalismo burocratizado. Parece una demanda difícil de resistir si es reclamada por los ciudadanos y dentro de una competencia entre Estados por ver quién es capaz de resolver mejor sus problemas por sí mismo. Aunque, no nos equivoquemos, si emprendemos esta senda entraremos en una importante crisis de gobernabilidad. Necesitamos nuevos instrumentos políticos para resolver los acuciantes problemas sociales heredados.
Tanto la vuelta a los nuevos / antiguos valores densos como el protagonismo estatal ofrecerán una nueva oportunidad a las políticas de izquierdas. Habrán recuperado, por decirlo así, las palancas sobre las que se apoyaban para emprender reformas. Es hasta posible que los sindicatos recuperen una parte de su poder y prestigio perdido. Pero huérfanas de un claro sentido de la idea de progreso y en su énfasis por gestionar una política dirigida a evitar los grandes males -desempleo, pensiones, pérdida de competitividad- abandonarán gran parte de su dimensión utópica. Se tratará de izquierdas administradoras de la nueva escasez, un papel que ya hubieron de asumir en otros tiempos históricos. Sus programas los dictará más la conservación de lo ya alcanzado que lo que queda por conseguir; administrar las pérdidas más que anticipar las ganancias derivadas de emprender un nuevo camino.
Un liderazgo acertado podrá, en todo caso, aprovechar la ocasión para desprenderse de los modelos fracasados y reconducir el orden social hacia un nuevo contrato social, un pacto social-democrático de nuevo cuño que sea capaz de trasladar la parroquial política estatal hacia una más decidida política de colaboración sintonizada a las dos dimensiones ya imprescindibles: la esfera transnacional y la cooperación con la sociedad civil. La política del futuro deberá estar menos pendiente de la gestión directa que de la impulsión y galvanización de acuerdos, iniciativas, persuasión, movilización ciudadana. Y esto último parece absolutamente decisivo en unos momentos en los que el imprescindible retorno de la política sigue encontrando un inmenso escollo en la desconfianza que amplios sectores de la ciudadanía siguen sintiendo hacia lo político.
No es de excluir, sin embargo, una alternativa que recupere la esencia del ya conocido populismo de derechas, la tozuda vuelta al Estado de ley y orden alimentado por un nacionalismo revivido. Fronteras, xenofobia, reafirmación de las identidades nacionales. Sería la otra dimensión, mucho más siniestra, del conservacionismo rampante. Es un discurso que encuentra el terreno abonado en situaciones de crisis, sobre todo si es capaz de engarzarse con éxito a los nuevos temores y consigue dar con una fórmula retórica capaz de catalizar el descontento general.
Con todo, el triunfo de Obama nos ha ubicado ante una ruta más positiva. Y nos ha dado las claves para recordar que, a pesar de todo, hay una inmensa fuente de poder social creativo que puede ser movilizado políticamente si encontramos las claves necesarias para hacerlo realidad. En democracia no hay poderes que estén cristalizados de una vez por todas. El poder es energía social que fluye y que siempre podemos ser capaces de canalizar hacia aquellos fines que merezcan ser emprendidos. Hoy no podemos eludir una orientación realista que, pragmáticamente, tome en consideración lo dado. Pero el nuevo pensamiento único de la rígida defensa de lo que existe no será capaz siquiera de satisfacer este objetivo si se aferra a las viejas certidumbres y a los antiguos instrumentos de acción política. Se echa en falta imaginación, liderazgo y un claro proyecto de futuro. Menos "conservacionismo" y más sentido del progreso.
Lo decisivo de esta vuelta a la modernidad que se atisba en el horizonte es el contenido de que vayamos a dotar a lo nuevo de la neomodernidad, la forma en la que seamos capaces de extraer las consecuencias oportunas de la experiencia histórica y la aprovechemos para innovar social y políticamente. Si se recupera la política el futuro estará siempre abierto.
Fernando Vallespín es catedrático de Ciencia Política en la Universidad Autónoma de Madrid.

sábado, 22 de novembro de 2008

Crise e transição política dos EUA

A Folha de São Paulo publica, no dia 22 de novembro de 2008, artigo de autoria de Paul Krugman, originalmente publicado no New York Times, acerca da crise financeira e econômica mundial.


Crise é mais rápida que transição

Paul Krugman, do New York Times

Todo mundo está falando sobre um novo New Deal, por motivos óbvios. Em 2008, como em 1932, uma longa era de domínio político republicano chegou ao fim em meio a uma crise econômica e financeira que, aos olhos dos eleitores, tanto desacreditou a ideologia de livre mercado que o Partido Republicano sempre defendeu quanto solapou as alegações de competência administrativa de seus líderes. E para as pessoas que se posicionam na banda progressista do espectro político, o momento é de esperança.
Mas existe também um segundo paralelo, mais perturbador, entre a situação de 1932 e a de 2008 a saber, o surgimento de um vácuo de poder em um momento culminante da crise. O interregno de 1932-1933, aquele longo período entre a eleição e a transferência efetiva de poder, se provou desastroso para a economia dos Estados Unidos, ao menos em parte porque o governo em fim de mandato não tinha credibilidade, o governo que assumiria não tinha autoridade. A mesma coisa está acontecendo agora.
O que pode sair de errado nos dois meses que nos separam da posse de Obama? A resposta, infelizmente, é: muita coisa. Considerem o quanto o quadro econômico se agravou no período que sucedeu a quebra do Lehman Brothers, acontecida há apenas pouco mais de dois meses. E o ritmo de deterioração parece estar se acelerando.
Um indício óbvio é o fato de que estamos em meio ao pior crash nos mercados de ações desde a Grande Depressão: o índice Standard & Poor's 500 está hoje mais de 50% abaixo de seu pico. Há outros indicadores talvez até mais perturbadores: os pedidos de benefícios-desemprego estão em alta, a produção industrial está despencando, as taxas de juros nos títulos corporativos que refletem os temores de inadimplência entre os investidores estão em disparada e isso quase certamente resultará em corte acentuado nos gastos das empresas. As perspectivas econômicas parecem muito mais sombrias hoje do que era o caso uma ou duas semanas atrás.
Mas a política econômica, em lugar de tentar responder à ameaça, parece ter tirado férias. Um problema particularmente grave é que o pânico retornou aos mercados de crédito e nada está sendo feito para preparar um novo plano de resgate. Pelo contrário: o secretário do Tesouro, Henry Paulson, declarou que não pretende voltar ao Congresso para obter a segunda metade dos US$ 700 bilhões já aprovados para o resgate ao setor financeiro. E a assistência financeira ao setor automobilístico em séria crise está paralisada devido a um impasse político.
Até que ponto esses dois meses de deriva política deveriam nos preocupar? No mínimo, os próximos dois meses infligirão sérios danos a centenas de milhares de norte-americanos, que perderão seus empregos, suas casas ou ambos. O que realmente incomoda, porém, é a possibilidade de que parte do dano que está sendo causado agora venha a se provar irreversível. Estou especialmente preocupado com duas coisas: deflação e Detroit.
Quanto à deflação, a "década perdida" do Japão nos anos 90 ensinou que é muito difícil recolocar a economia em movimento quando as expectativas de inflação se tornam excessivamente baixas (não importa se as pessoas esperam ou não que os preços literalmente caiam). No entanto, a economia americana enfrenta clara pressão deflacionária. Cada mês que passa sem sinais de recuperação eleva a chance de que nos vejamos aprisionados em uma armadilha como a do Japão.
Quanto a Detroit: existe um risco verdadeiro de que, na ausência de assistência rápida, as três grandes montadoras de automóveis e sua rede de fornecedores vão à bancarrota. Caso isso aconteça, trazê-las de volta será muito difícil.
É fato que permitir a morte das montadoras de automóveis talvez seja a decisão correta, ainda que o colapso da indústria automobilística possa representar mais um duro golpe. Mas trata-se de uma decisão que deveria ser tomada com cuidado e não por inércia, devido a um impasse entre os democratas que desejam que Paulson empregue parte dos US$ 700 bilhões do pacote de resgate para essa finalidade e um governo em fim de mandato que em lugar disso está tentando forçar o Congresso a desviar fundos que bancariam um programa de promoção da eficiência energética.
A política econômica estará completamente paralisada daqui até o dia 20 de janeiro? Não, não completamente. Algumas medidas úteis estão sendo tomadas. Por exemplo, as agências de crédito hipotecário Fannie Mae e Freddie Mac suspenderam temporariamente as execuções de hipotecas.
Mas não temos nada acontecendo na frente política em escala minimamente compatível com as dimensões da crise econômica. E é assustador imaginar quantas coisas mais podem acontecer de errado daqui até o dia da posse.

Diplomacia brasileira adota nova postura

Matéria da Folha de São Paulo, do dia 22 de novembro de 2008, fala do endurecimento da diplomacia brasileira em relação ao Equador, caracterizando, assim, uma nova postura do governo em suas relações com outros países sulamericanos.


Lula compra sua primeira

Clóvis Rossi

Ao chamar embaixador para consultas, presidente sinaliza que está pronto para radicalizar, contrariando estilo "paz e amor" nas relações internacionais
ERA UMA VEZ um tempo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silvia dizia: "Se eu não briguei com o Bush, não vou brigar com ninguém".
Esse tempo acabou ontem, no momento em que Lula instruiu o chanceler Celso Amorim a chamar para consultas o embaixador brasileiro em Quito, Antonino Marques Porto, no que equivale, para usar a linguagem do próprio presidente, a brigar com Rafael Correa, o presidente equatoriano.
Não deixa de ser uma ironia que o presidente que não brigou com Bush, teoricamente seu antípoda ideológico, entre em conflito justamente com um mandatário com o qual tem afinidades ideológicas, na medida em que Correa faz parte da leva de governantes de esquerda/centro-esquerda que se elegeram na América do Sul neste século, ainda que a maioria deles tenha adotado políticas que só uma licença poética poderia chamar de esquerdistas.
Mas a divergência com Correa não é de conteúdo, é de forma. Traduzindo: o governo brasileiro não questiona o direito de Correa de contestar o empréstimo de US$ 243 milhões contraído no BNDES -o motivo da "briga".
Mas diverge radicalmente da forma como foi feita a operação. Correa não teve a delicadeza básica de telefonar para Lula ou para o Ministério brasileiro das Relações Exteriores para consultar ou, pelo menos, avisar que estava recorrendo à arbitragem internacional para tentar não pagar o empréstimo.
"Os telefones em Quito funcionam", ironiza, por exemplo, Marco Aurélio Garcia, o assessor internacional do presidente Lula e interlocutor assíduo dos governantes sul-americanos.

Em outra moeda
O que irrita Lula é o fato de que o seu governo tratou Correa -e todos os demais governantes sul-americanos, de direita, de esquerda, de centro, de centro-esquerda- com o máximo de atenção, cortesia e disposição para ouvir queixas e tentar resolvê-las.
A atenção e a cortesia foram ainda maiores para com presidentes de países mais pobres (Bolívia, principalmente).
"Se um governo amigo nos trata dessa maneira, como seria o comportamento de um governo inimigo, se o tivéssemos?" -indaga Marco Aurélio.
O antecedente mais próximo da situação agora criada com o Equador foi a nacionalização do gás na Bolívia, pouco depois da posse de Evo Morales. Não pela nacionalização em si, que Lula disse ter entendido perfeitamente, mas pela maneira como Morales se comportou em seguida: deu uma entrevista coletiva em Viena, à margem da cúpula União Européia-América Latina e Caribe, para criticar duramente o Brasil e a Petrobras, enquanto Lula viajava de Brasília para Viena.
O presidente brasileiro, antes de responder, pediu a fita da entrevista, para não basear-se em interpretações dos jornalistas. Quando se encontrou com o colega boliviano, no dia seguinte, avisou: "Não ponha uma espada na minha cabeça para negociar".
Evo Morales pôs a espada de lado, embora as divergências Brasil/Bolívia continuem em muitos pontos, mas todos sendo tratados em negociações nas quais o governo brasileiro não tem sido surpreendido, ao contrário do que ocorreu com Rafael Correa agora.
Exatamente pela falta de antecedentes, é difícil antecipar o que acontece agora que Lula resolveu "brigar" pela primeira vez em seus praticamente seis anos de governo.
Mas, no governo brasileiro, o que se diz é que a bola está com Correa. Cabe a ele o próximo gesto, se de apaziguamento ou de radicalização.
Ao chamar o embaixador em Quito a Brasília para consultas, Lula está implicitamente avisando que está pronto para radicalizar também, contrariando o estilo "paz e amor", que adotou para vencer a eleição em 2002 e ampliou para as relações internacionais.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

China e Índia serão potências mundiais até 2020

O jornal O Estado de São Paulo do dia 21 de novembro de 2008 divulga estudo de agências de inteligência americanas acerca das do poderio futuro das potências emergentes.


Até 2020, China e Índia serão potências mundiais

Estudo de órgãos de inteligência dos EUA aponta Brasil como país ‘essencial’ e diz que seu futuro terá profundo impacto econômico e político na região

Patrícia Campos Mello, WASHINGTON

O Conselho Nacional de Inteligência do governo americano prevê que China e Índia vão se consolidar como as novas potências mundiais até 2020, enquanto Brasil, Indonésia, Rússia e África do Sul vão ganhar poder econômico, mas não devem “ter o mesmo peso político de Índia e China”.

“O crescimento desses países vai beneficiar seus vizinhos, mas não é provável que eles se transformem em potências econômicas que conseguirão alterar o equilíbrio de poder além de suas regiões - um elemento-chave da ascensão econômica e política de Pequim e Nova Délhi”, diz o Conselho em seu relatório Mapeando o Futuro Global - Projeto 2020, divulgado ontem.

O estudo prevê vários cenários para o mundo em 2020 e foi elaborado pela equipe do Conselho Nacional de Inteligência, que reúne a CIA e outros 15 órgãos de inteligência dos EUA. O Conselho acredita que, em 2020, “os EUA ainda serão o país mais importante em todas as dimensões de poder, apesar do desgaste de sua posição”.

O Brasil - ao lado de África do Sul, Rússia e Indonésia - faz parte dos “países arrivistas” (emergentes), segundo o relatório. “Esses países vão reforçar o papel de China e Índia, mas eles mesmos terão impacto geopolítico mais limitado.”

Enquanto isso, a Europa, o Japão e também a Rússia estarão sob pressão para lidar com o envelhecimento de sua população.

IMPACTO

O estudo aponta o Brasil como um país “essencial” com uma “democracia vibrante, economia diversificada, população empreendedora, grande patrimônio nacional e instituições econômicas sólidas”.

“O sucesso ou fracasso do Brasil ao equilibrar medidas econômicas pró-crescimento com uma agenda social ambiciosa para reduzir pobreza e desigualdade de renda vai ter um impacto profundo no desempenho econômico da região e governança nos próximos 15 anos”, diz o documento.

Segundo o conselho de inteligência, a atração de investimentos estrangeiros e a estabilidade regional vão continuar sendo axiomas da política externa brasileira. “O Brasil é um parceiro natural para os EUA e a União Européia e para as potências emergentes China e Índia, e tem o potencial de aumentar sua estatura como exportador de petróleo.” O relatório diz também que o Brasil e a África do Sul são histórias de sucesso que devem servir de modelo para suas regiões.

O conselho compara a emergência da China e da Índia à unificação da Alemanha no século 19 e ao poder dos EUA no século 20. Só uma “reversão abrupta do processo de globalização ou uma enorme convulsão nesses países evitaria a ascensão de China e Índia”.

Lei não deve impedir apuração de torturas

Matéria da Folha de São Paulo do dia 21 de novembro de 2008 mostra a opinião do relator das Nações Unidas para Tortura, Manfred Nowak, acerca das leis de anistia.


Lei não barra apuração de torturas, diz ONU

Marcelo Ninio, de Genebra
Repressão cometida pela ditadura militar não deve ser anistiada por ser crime contra a humanidade e imprescritível, diz Nowak

Especialista é responsável pelo relatório das Nações Unidas que trata dos abusos cometidos contra detentos na prisão de Guantánamo

Nenhuma lei de anistia deveria impedir a investigação de crimes como a tortura. A opinião é de Manfred Nowak, relator das Nações Unidas para Tortura, para quem a obrigação moral de levar os responsáveis por tais delitos à Justiça sobrepõe-se a qualquer legislação.
Nowak foi além: para ele, ações de repressão cometidas pela ditadura militar, como tortura, desaparecimentos e execuções extrajudiciais são "crimes contra a humanidade", portanto imprescritíveis.
"Quando falamos na tortura sistemática praticada no regime militar do Brasil a partir da década de 60, é claro que ela pode ser considerada um crime contra a humanidade", disse o jurista austríaco.
Um dos principais especialistas da ONU em direitos humanos, Nowak é um dos autores do relatório da organização sobre abusos cometidos na prisão americana de Guantánamo, entre outros trabalhos.
Nowak não se opôs a entrar na controvérsia surgida no governo brasileiro sobre o tema, depois que a Advocacia Geral da União divulgou um parecer em que considerou os crimes cometidos na ditadura perdoados pela Lei de Anistia, de 1979.
"Leis de anistia não deveriam ser usadas para evitar investigações sobre tortura", disse Nowak. Segundo ele, embora a Convenção contra a Tortura da ONU (da qual o Brasil é signatário) não mencione possíveis limitações impostas por leis nacionais, "existe uma obrigação" de investigar e levar os responsáveis à Justiça.
"Mesmo não sendo explícito, essa é a interpretação", disse o relator. Ele reconhece as dificuldades políticas de reabrir feridas do passado, sobretudo depois que os esforços de reconciliação se transformaram em legislação. Mas observou que em países como Chile, Argentina e Uruguai, que aprovaram suas próprias leis de perdão, "ficou claro que nenhuma anistia deveria ser aplicada aos crimes mais sérios, como a tortura".
"A questão é até onde essa lei [de anistia] deve ser aplicada", disse o austríaco. Ele elogiou as ações feitas no Brasil desde o fim da ditadura para reconhecer os crimes cometidos no regime militar e indenizar suas vítimas. Mas acha que há uma lacuna em relação à tortura.
"O Brasil tornou-se um modelo para outros países ao reconhecer os crimes e aprovar no Congresso o pagamento de compensações a famílias de desaparecidos", disse Nowak. "Nesse ponto o Brasil fez muito, mas não sobre tortura."

Guantánamo
Ao falar que está confiante de que o novo governo americano fechará a prisão de Guantánamo até o fim de 2009, Nowak disse que tem mantido contato com vários governos, sobretudo da Europa, para convencê-los a receber detentos que correm riscos de retaliações se voltarem a seus países de origem.
Na América do Sul, contudo, a receptividade até agora foi pequena, segundo ele. "Acho que os países da região preferem continuar longe do conflito." Em 2007, o Brasil acolheu cerca de cem refugiados palestinos que viviam no Iraque.

Juiz americano ordena a libertação de argelinos presos em Guantánamo

Posta-se abaixo notícia do jornal O Estado de São Paulo, do dia 21 de novembro de 2008, acerca da liberação pelo Tribunal Federal de Washington de cinco argelinos detidos em Guantánamo.


Juiz manda soltar 5 presos em Guantánamo

Tribunal federal julga ilegal a detenção, sem provas, de suspeitos de terrorismo na base militar americana

Reuters, AP, NYT e WP, Washington

Um juiz federal de Washington ordenou ontem a libertação de cinco argelinos presos sem acusação formal há sete anos na base militar de Guantánamo, em Cuba. O juiz Richard Leon não aceitou as provas apresentadas pelo governo, que garante que os argelinos pretendiam viajar ao Afeganistão para combater as forças americanas. É a primeira vez que um tribunal civil rejeita provas apresentadas pela Casa Branca.

Em um veredicto pouco comum, Leon fez um pedido para que o governo não recorra de sua decisão. “Sete anos esperando uma resposta de nosso sistema legal é tempo suficiente”, escreveu o juiz. O Departamento de Justiça afirmou ontem que analisaria novamente o processo antes de decidir se apelaria ou não.

A Casa Branca disse ontem que “discorda” do veredicto. Analistas afirmaram que é muito provável que o governo recorra e tente adiar ao máximo a libertação dos presos. A estratégia é empurrar ao máximo o problema para o próximo governo, que assume em janeiro.

O veredicto é conseqüência da decisão da Suprema Corte, que em junho determinou que os suspeitos de terrorismo presos em Guantánamo têm o direito de recorrer a tribunais federais para serem libertados. Em outubro, um juiz federal já havia se aproveitado da decisão e ordenado a libertação imediata de 17 prisioneiros chineses da etnia uigur, também detidos em Guantánamo.

Na ocasião, a Casa Branca anunciou que não recorreria da decisão porque não considerava os chineses uma ameaça à segurança nacional, mas pediu um adiamento da execução da sentença porque não sabe o que fazer com os chineses.

Sem ter para onde ir, eles continuam presos - a China se recusa a recebê-los, enquanto o governo Bush não admite soltá-los nos EUA. O caso irá a julgamento novamente na segunda-feira. O governo alega que um juiz federal não tem autoridade para libertá-los em território americano.

RECURSO

Os cinco argelinos - Lakhdar Boumediene, 42 anos, Mustafa Ait Idir, 38 anos, Mohamed Nechla, 40 anos, Hadji Boudella, 43 anos e Saber Lahmar, 39 anos - foram presos em 2001 na Bósnia, onde moravam, e levados para Guantánamo. Desde então, estão presos sem acusação formal nem julgamento marcado. O governo garante que eles planejavam viajar até um dos campos de treinamento da Al-Qaeda no Afeganistão, mas a defesa afirma que os cinco foram presos por engano.

No entanto, o juiz considerou que um sexto prisioneiro argelino, Belkacem Bensayah, deve ser mantido encarcerado na base por haver evidências de sua ligação com a Al-Qaeda. Os advogados de Bensayah, porém, recorrerão da decisão.

Paraguai reclama de movimentação de tropas brasileiras

A Folha de São Paulo do dia 21 de novembro de 2008 traz matéria sobre incursão de tropas brasileiras em território paraguaio feita por engano.


Paraguai chama de provocação incursão de tropas brasileiras

Iuri Dantas, da Sucursal de Brasília
Em tom duro, Assunção diz que episódio é "prática recorrente de confrontação" e convoca embaixador do Brasil no país

Incidente ocorreu na última quarta, quando 30 soldados em exercício no MS cruzaram fronteira por 30 m; Itamaraty atribui texto a nacionalismo
O governo do Paraguai reagiu ontem contra a entrada de militares brasileiros em território do país, acusando o Brasil de "prática e atitude recorrente de confrontação e provocação" em um "comunicado à opinião pública nacional" assinado pelo chanceler Alejandro Hamed Franco e pelo ministro da Defesa, Luis Bareiro Spaini.
"O incidente, que afeta a nossa soberania, soma-se a episódios muito recentes no mesmo sentido, no que parece uma inexplicável mas sistemática prática e atitude recorrente de confrontação e provocação", diz um dos quatro parágrafos do comunicado paraguaio.
O embaixador brasileiro em Assunção, Eduardo dos Santos, foi convocado pela Chancelaria paraguaia para prestar esclarecimentos sobre o episódio. Após conversar com Franco, o diplomata brasileiro classificou a presença de tropas brasileiras em território paraguaio como "mal-entendido". Para o embaixador, as movimentações militares são regulares e não houve violação da soberania.
Em entrevista coletiva após receber Santos, Hamed foi questionado sobre se a posição oficial havia mudado após as explicações do Brasil. "Claro que não", respondeu. O chanceler paraguaio disse, depois, acreditar na necessidade de ambas as partes coordenarem esse tipo de manobra no futuro.
O governo paraguaio não foi informado sobre o exercício com antecedência.
O estopim do incidente diplomático ocorreu anteontem, quando policiais da cidade paraguaia de Canindeyú (leste) disseram ter localizado aproximadamente 30 soldados brasileiros da 17ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, dois blindados e duas caminhonetes do Exército em uma área a 30 metros da fronteira. A brigada fica sediada na cidade Amambaí, em Mato Grosso do Sul.
Quando foi advertido sobre a entrada em território paraguaio, o capitão Pedro Porto, que comandava o treinamento, afirmou que entrou no Paraguai por desconhecimento, desculpou-se e retirou os soldados de volta ao Brasil.
O exercício foi realizado em uma área de fronteira seca, onde não há demarcação ostensiva do limite territorial dos dois países, segundo o Itamaraty.
O episódio reacendeu críticas ao Brasil na imprensa paraguaia. Desde a campanha eleitoral que levou o ex-bispo Fernando Lugo à Presidência, os chamados brasiguaios sofrem hostilidades no país.
Atualmente, o Brasil e o Paraguai discutem como os dois países podem aprofundar a cooperação na área econômica para promover maior industrialização no país vizinho. Os paraguaios também insistem em revisar o tratado da usina binacional de Itaipu, mas o Brasil discorda.
A assessoria de imprensa do Itamaraty atribuiu a dureza da nota de Assunção a "manifestações de apelo nacionalista por parte da imprensa paraguaia". Segundo a Chancelaria brasileira, tratava-se de um "exercício de rotina de adestramento e formação militar para os pelotões de fronteira".
Recentemente, a imprensa paraguaia especulou que o governo Lula poderia ocupar militarmente a usina caso houvesse algum conflito com Lugo.
A assessoria do chanceler Celso Amorim disse não ter havido, "em nenhum momento, sentido de provocação ou confrontação. O que prevalece nas relações das Forças Armadas é a cooperação e a amizade."
Procurado pela Folha, o Ministério da Defesa informou que não iria se pronunciar.
Com a Efe

O pluralismo jurídico no contexto religioso

O Prof. Farlei Martins com base no jornal "New York Times de 19 de novembro de 2008 envia a seguinte notícia sobre a dimensão do pluralismo jurídico no camo da religião na Grã Bretanha.


Tribunais islâmicos no Reino Unido não são novos, mas o furor é

A mulher vestida de preto queria um divórcio islâmico. Ela disse ao juiz religioso que seu marido batia nela, a xingava e queria que ela morresse. Mas seu marido era contrário, e o estudioso islâmico que julgava o caso parecia determinado a manter o casal unido. Assim, ao pressentir a derrota, ela trouxe sua arma secreta: seu pai.
Um homem barbado vestindo túnica longa entrou no recinto e descreveu seu genro como sendo um homem colérico que enganou sua filha, fugiu da polícia e humilhou sua família. O juiz prontamente mudou sua posição e recomendou o divórcio. Esta é a justiça islâmica, estilo britânico. Apesar do ruidoso debate nacional em torno dos limites da tolerância religiosa e da preeminência da lei britânica, os princípios da Shariah, ou lei islâmica, estão cada vez
mais sendo aplicados na vida cotidiana em cidades por todo o país.
A Igreja da Inglaterra possui seus próprios tribunais eclesiásticos. Os judeus britânicos também contam com seus tribunais "beth din" há mais de um século. Mas desde que o arcebispo de Canterbury, Rowan Williams, pediu em fevereiro para que aspectos da Shariah islâmica fossem abraçados ao lado do sistema legal tradicional, o governo tem enfrentado um furor público em torno da questão, aplacando os críticos ao mesmo tempo em que tenta tranqüilizar uma
desconfiada e às vezes insatisfeita população muçulmana de que suas tradições têm um lugar na sociedade britânica.
Encaixotado entre os dois lados, o governo adotou uma posição tanto cautelosa quanto confusa, um sinal de quão volátil pode se tornar quase toda discussão sobre o papel dos quase 2 milhões de muçulmanos do Reino Unido.
"Não há nada na lei inglesa que impeça as pessoas de obedecerem os princípios da Shariah se desejarem, desde que não entrem em conflito com a lei inglesa", disse o ministro da Justiça, Jack Straw, em outubro. Mas ele acrescentou que a lei britânica "sempre permanecerá suprema" e que "independente da crença religiosa, nós todos somos iguais perante a lei".
Tanto conservadores quanto liberais - muitos deles alheios ao fato de que tribunais islâmicos já estão em funcionamento há anos- têm repetidamente condenado os tribunais como substitutos ruins para a jurisprudência britânica. Eles argumentam que os procedimentos dos tribunais islâmicos são sigilosos, sem responsabilidade e sem padrões para o treinamento ou decisões
dos juízes.
Os críticos também apontam para os casos de violência doméstica, nos quais os estudiosos islâmicos tentaram manter os casais unidos ao ordenarem os maridos a se submeterem a cursos de controle da raiva, deixando as esposas tão intimidadas a ponto de retirarem suas queixas da polícia.
"Eles são reféns do acaso", disse Parvin Ali, diretora fundadora da Fatima Womens's Network, um grupo de ajuda às mulheres com sede em Leicester. Falando a respeito dos tribunais, ela disse que "não há monitoramento externo, nenhuma proteção, nenhum registro é mantido, nenhuma garantia de que a justiça prevalecerá".
Mas enquanto continua o alvoroço, a popularidade dos tribunais entre os muçulmanos tem aumentado. Alguns dos conselhos informais, como são conhecidos os tribunais, têm aconselhado e julgado muçulmanos há mais de duas décadas. Mas os conselhos cresceram significativamente em número e proeminência nos últimos anos, com alguns estudiosos islâmicos informando um aumento de 50% dos casos desde 2005.
Quase todos os casos envolvem pedido de divórcio por mulheres, e por meio do boca a boca e de um uso ambicioso da Internet, tribunais como o prédio pequeno e sem adornos em Londres, onde o pai veio defender o caso de sua filha, se tornaram ímãs para mulheres muçulmanas que buscam escapar de casamentos sem amor - não apenas no Reino Unido, mas às vezes também na
Dinamarca, Irlanda, Holanda e Alemanha.
Outras causas envolvem disputas em torno de propriedades, trabalho, heranças e lesões corporais. Os tribunais se abstêm de casos criminais que possam exigir a imposição de punições como chicotadas ou apedrejamento.
De fato, a maioria das decisões dos tribunais não são sustentadas pela lei civil britânica, mas para as partes que se apresentam perante eles, os tribunais oferecem algo mais importante: a autoridade de Alá.
"Nós não queremos passar a impressão de que os muçulmanos são uma comunidade isolada em busca de um sistema legal separado neste país", disse o dr. Shahid Raza, que julga as disputas em um centro islâmico em Ealing, no oeste de Londres. "Nós não estamos pedindo por uma lei Shariah criminal - para que mãos sejam decepadas ou ocorram apedrejamentos até a morte. Divórcios representam 90% de nossos casos, nos quais as mulheres procuram alívio. Nós estamos ajudando as mulheres. Nós estamos prestando um serviço."
Ainda assim, há bastante espaço para disputas com o costume britânico. Há três meses, por exemplo, uma rica família bengalesa pediu o conselho de Raza para resolver uma disputa de herança. Ela foi resolvida segundo a Shariah, ele disse. Isso fez com que os herdeiros do sexo masculino recebessem duas vezes mais do que as herdeiras do sexo feminino.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

EUA e América Latina

O Valor Econômico do dia 20 de novembro de 2008 traz matéria sobre entrevista concedida pelo secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, na qual o diplomata fala sobre as relações entre os EUA e a América Latina.


EUA dificultam relações amistosas, diz diplomata

Sergio Leo
A atuação dos Estados Unidos na América do Sul é prejudicada pelo financiamento americano a organizações não governamentais com forte atuação na política interna e as repetidas acusações de que não são democráticos os governos da Venezuela, Bolívia e Equador, disse o secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães. A eleição de Barack Obama para a presidência dos EUA é, porém, a negação da política externa anterior do país, de desconsideração com os princípios multilaterais das Nações Unidas, comentou.
Em entrevista para o programa "Jogo do Poder", na emissora a cabo CNT, Pinheiro Guimarães, normalmente avesso a declarações públicas, defendeu o presidente venezuelano Hugo Chávez, acusado pela oposição de usar gravações clandestinas de líderes oposicionistas como arma de propaganda nas atuais eleições para governos estaduais no país. O diplomata disse acreditar que, para se avaliar as acusações a Chávez, é preciso acompanhar os resultados das eleições venezuelanas e que acusações como essas são comuns em períodos eleitorais.
Pinheiro Guimarães comentou que as relações da Venezuela com os Estados Unidos devem ser entendidas lembrando-se que o governo americano deu reconhecimento, como governo legítimo, ao grupo formado por importantes membros da oposição na Venezuela que, por pouco tempo, deu um golpe de Estado no país, em 2002, derrubando e prendendo Chávez por algumas horas. Outro fator de atrito é o financiamento, com verbas oficiais americanas de fundos como o National Endowment for Democracy, de ONGs que interferem na política interna da Venezuela, disse ele.
"Isso cria tensões permanentes, e a própria retórica usada de um lado e do outro torna cada vez mais difícil o relacionamento", comentou. Ele reprovou as acusações aos governos da Bolívia, Equador e Venezuela de antidemocráticos, lembrando que todos passaram por eleições com aprovação de observadores internacionais.
Se a televisão brasileira tratasse os governos como a venezuelana trata Chávez, já estaria sob processos judiciais, o que não acontece lá, comparou. Na Venezuela, Chávez recusou-se a renovar a concessão da principal emissora de TV, fortemente ligada à oposição no país - uma decisão a que muitos analistas atribuem a derrota que o venezuelano sofreu no plebiscito realizado para confirmar a Constituição que daria mais poderes ao Executivo. Chávez, mesmo sob ameaças, acatou o plebiscito.
"A eleição de Barack Obama é fato de extraordinária importância", avaliou Pinheiro Guimarães. Ela encerra um período difícil para a política externa americana, com certas doutrinas, como a intervenção preventiva, que levou à invasão do Iraque", comentou, acusando o governo Bush de desrespeitar os direitos humanos.
Pinheiro Guimarães disse não crer no recrudescimento do protecionismo nos EUA, com a vitória democrata, devido à grande integração mundial das indústrias instaladas no país e ao baixo patamar em que está a maioria d as tarifas e importação. Ele defendeu o acordo entre Brasil e Argentina para aumentar a tarifa externa comum do Mercosul sobre produtos como têxteis, vinhos, lácteos e artefatos de couro, insistindo que não pode ser considerada uma media protecionista. Os aumentos estão dentro dos limites autorizados pela Organização Mundial do Comércio, argumentou o diplomata.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Estatuto do Índio está próximo de ser aprovado pelo Congresso

O jornal Correio Braziliense publica no dia 19 de novembro de 2008 notícia sobre a criação do Estatuto do Índio e sobre a demarcação de terras indígenas.


Riqueza em terras indígenas

QUESTÃO INDÍGENA
Estatuto do Índio deve ser aprovado ainda este ano pelo Congresso Nacional, regulamentando, entre outras questões, a mineração nas reservas. Aldeias esperam também demarcação de 400 novas áreas
Leonel Rocha
Da equipe do Correio
Previsto para ser votado ainda este ano pelo Congresso, o novo Estatuto do Índio deverá trazer as regras para a mineração em reservas indígenas. Essa foi a orientação definida junto com as comunidades durante 10 oficinas regionais realizadas pela Comissão Nacional de Política Indígena(CNPI) e concluídas há quase uma semana. As principais lideranças do setor consideram mais seguro e adequado que as regras para a exploração de minérios sejam estabelecidas em conjunto com outras definições sobre os direitos e deveres dos índios. A exploração mineral nas reservas está prevista na Constituição, mas nunca foi regulamentada.

Paralisado desde 1994 no Congresso, o estatuto vai funcionar como uma espécie de Constituição específica para orientar a relação de 800 mil indígenas brasileiros com a terra, outras comunidades e com o potencial econômico das áreas onde vivem. Também vai definir questões como a participação das comunidades na elaboração das políticas públicas de saúde e educação, por exemplo.

O governo pretende apresentar emendas ao antigo projeto de lei porque a primeira versão do estatuto já foi aprovada na comissão especial da Câmara criada para tratar do tema. Com as emendas, a CNPI pretende incluir normas como a regulamentação da exploração dos conhecimentos tradicionais das comunidades e o poder de polícia da Funai, hoje exercido em parceria com a Polícia Federal. “Os povos indígenas nunca foram ouvidos como agora”, comemora a secretária executiva da CNPI, Teresinha Gasparin Maglia.

Demarcação
Mais de 15 anos após o prazo estabelecido pela Assembléia Constituinte de 1988, as comunidades indígenas aguardam também a conclusão das demarcações definitivas de suas terras. Existe uma fila com mais de 400 solicitações de identificação de novas áreas. Dessas, cerca de 100 estão em estudos pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Além do atraso na definição das terras, um outro problema aflige os índios. Quase metade da população vive confinada em menos de 2% das áreas demarcadas, localizadas fora da Amazônia. Na Região Norte, vive a outra metade, que ocupa 98% das terras destinadas a eles. “Estamos em uma situação dramática. As pequenas áreas demarcadas fora da Amazônia se transformaram em verdadeiros depósitos de índios nos arredores das cidades”, lamenta Paulo Santilli, dirigente da Funai.

A direção da instituição não sabe ao certo quanto de área será necessária para acomodar a população de índios. Além disso, o trabalho administrativo passou a depender dos julgamentos de 140 ações que questionam no Supremo Tribunal Federal (STF) as demarcações já definidas. Entre elas estão a de Raposa-Serra do Sol, em Roraima, e a dos Pataxós Hã-Hã-Hãe, no sul da Bahia.

O caso mais dramático de índios sem terra é o dos Guarani Kaiowá e Ñandeva, em Mato Grosso do Sul. Há pouco mais de um mês, a Funai fechou acordo com o governo do estado para começar, ainda este ano, os estudos de identificação da área destinada aos quase 11 mil índios que vivem nas periferias das cidades mato-grossenses. Hoje o presidente da Funai, Márcio Meira, vai explicar na comissão de Agricultura da Câmara como será o trabalho dos antropólogos com a edição das seis portarias que autorizam estudos em 26 municípios do estado para a criação das reservas indígenas. O prazo estimado pelos procuradores federais que tratam do caso para conclusão do processo é abril de 2010. O dilema dos Guarani provocou uma série de suicídios de índios há alguns anos.

O último levantamento da Funai mostra que as áreas indígenas em análise e já regularizadas somam quase 107 milhões de hectares. Desse total, 96,4 milhões de hectares já estão regularizados (veja mapa). Hoje, as terras indígenas representam 12,5% do território brasileiro. Segundo o ex-presidente da Funai Mércio Pereira Gomes, a população indígena brasileira poderia ser acomodada em pouco mais de 13% do território nacional. “As áreas mais importantes já foram demarcadas. Restam alguns ajustes para que esse trabalho seja concluído”, prevê o antropólogo.

Há dois meses, a Funai concluiu estudos sobre novas reservas destinadas a 24 etnias localizadas em 30 municípios. Os processos aguardam definição do Ministério da Justiça. Ao todo são quase 870 mil hectares. A maior parte deles engloba terras nos municípios de Juara, Nova Canaã do Norte e Tabaporã, em Mato Grosso. Além das listas da Funai, o Conselho Indigenista Missionário(Cimi) identificou outras 375 terras de várias etnias passíveis de demarcação.


REFÉNS EM MATO GROSSO
Funcionários da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) foram feitos reféns ontem à tarde, em Canarana (MT), por índios de cinco etnias do Xingu. Ao todo, 12 servidores foram impedidos de deixar o prédio do órgão. Segundo informou o site G1, os índios reivindicam a manutenção de uma parceria entre a Funasa e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) para prestação de serviços de saúde à comunidade indígena. De acordo com a Funasa, a parceria tem duração até 31 de março. Depois disso, será definido se outra universidade passará a atender a comunidade.
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"Estamos em uma situação dramática. As pequenas áreas demarcadas fora da Amazônia se transformaram em verdadeiros depósitos de índios nos arredores das cidades "
Paulo Santilli, dirigente da Funai