segunda-feira, 27 de abril de 2009

Os Estados Unidos foram salvos pela tortura?

Época

27/04/2009

Um relatório da CIA diz que interrogatórios brutais evitaram um novo ataque terrorista em Los Angeles
Rodrigo Turrer

PRESSÃO
Khalid Shaikh Mohammed, um dos líderes da Al Qaeda, foi afogado 183 vezes antes de confessar Quando o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, liberou a divulgação de memorandos do Departamento de Justiça sobre as técnicas de interrogatório da Agência Central de Inteligência (CIA), no dia 17, fez renascer uma crise política que parecia terminada. A crise que abalroou o governo de seu antecessor, George W. Bush, com as evidências de que os Estados Unidos praticaram tortura contra prisioneiros suspeitos de terrorismo. Ao tomar posse, Obama pôs fim aos métodos brutais de interrogatório – privação de sono, confinamento do prisioneiro numa caixa com insetos e waterboarding, uma simulação de afogamento – e não divulgou os documentos. Até mudar de ideia. “Reter esses documentos serviria apenas para negar fatos de domínio público”, disse Obama, na semana passada.

Engano. Teria servido também para evitar duas polêmicas. A primeira: os documentos sugerem que, por conta da tortura, a CIA conseguiu evitar um novo ataque ao estilo do perpetrado em 11 de setembro de 2001, que matou quase 3 mil pessoas. Desta vez, o alvo de um avião sequestrado seria o maior prédio da Costa Oeste americana, a Library Tower, de 73 andares e 310 metros, em Los Angeles, segundo a confissão de Khalid Shaikh Mohammed, autoproclamado mentor dos atentados contra as torres gêmeas. Mohammed teria revelado o plano depois de ser submetido a 183 sessões de simulação de afogamento. Sua confissão levantou na direita americana novos clamores em defesa das “técnicas intensivas de interrogatório” para deter o terrorismo. De acordo com os partidários de Bush, as evidências sugerem que essas técnicas serviram para salvar vidas.

A segunda polêmica emanou da esquerda. Aliados de Obama e grupos de defesa dos direitos humanos passaram a exigir punição para os responsáveis pelos interrogatórios. Sabendo que isso poderia minar o moral da CIA – e diminuir sua eficiência no combate ao terrorismo –, Obama imediatamente descartou processar os agentes. Mas deixou em aberto a possibilidade de processar quem autorizou o uso das técnicas brutais. Isso aguçou a divisão entre democratas e republicanos. Um ex-oficial da CIA acusou o vice de Bush, Dick Cheney, de pressioná-lo para obter confissões de que o grupo terrorista Al Qaeda tinha ligações com o ditador do Iraque, Saddam Hussein – justificativa dada para invadir o Iraque, em 2003, que depois se revelaria falsa.

Processar ex-governantes por suas decisões políticas seria algo inédito nos EUA. E suscitaria várias dúvidas. Onde parava a responsabilidade? Nos funcionários subalternos? Em Cheney? Em Bush? Ou na presidente do Congresso, a democrata Nancy Pelosi, que fazia parte do comitê informado dos métodos da CIA? Estabelecer uma fronteira é tão subjetivo que fica difícil imaginar que alguém venha a ser processado.

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