terça-feira, 28 de abril de 2009

Guerra contra terror não ignora direitos humanos

Correio Braziliense

28/04/2009

Rodrigo Craveiro

100 DIAS DE OBAMA
Presidente dos Estados Unidos rompeu com o governo antecessor ao banir tortura, fechar Guantánamo e divulgar documentos da CIA

Rodrigo Craveiro

Assim que assumiu a maior potência do planeta, o democrata Barack Obama herdou um país com a popularidade fustigada pelas violações dos direitos humanos cometidas durante o governo George W. Bush. No Salão Oval da Casa Branca, pairavam as imagens de prisioneiros iraquianos de Abu Ghraib ameaçados por cães e empilhados uns sobre os outros, nus e despidos de qualquer dignidade. Os abusos na base norte-americana de Guantánamo, onde muçulmanos viam soldados urinarem sobre o Corão, e as técnicas de tortura usadas contra suspeitos de terrorismo por oficiais da Agência Central de Inteligência (CIA) minaram os ideais de liberdade dos Estados Unidos. Apenas dois dias depois de tomar posse, Obama assinou três ordens executivas ordenando o fechamento da prisão em Cuba no prazo de um ano e revisando o tratamento aos suspeitos.

Um claro indício de ruptura com o passado foi a decisão de Obama de abrir os documentos secretos da CIA sobre métodos violentos de interrogatório. Ao ameaçar processar os oficiais da agência de inteligência, o líder democrata atraiu fortes críticas dos falcões da era Bush. Os memorandos revelavam que o então vice-presidente Dick Cheney e a secretária de Estado, Condoleezza Rice, haviam dado sinal verde para a tortura. Em entrevista ao Correio, por e-mail, Ron Huff — presidente da Sociedade Americana de Criminologia e doutor em sociologia pela Ohio State University — afirmou que os 99 dias do governo Obama têm refletido a devolução dos direitos humanos para suspeitos. “Guantánamo é um exemplo: muitos dos prisioneiros foram libertados recentemente sem acusações, depois de encarcerados por longos períodos”, admitiu. “O presidente quer dar um aviso de que, na luta contra o terror, os EUA não deveriam violar os direitos humanos e a lei internacional.”

A proposta de Obama, segundo Huff, é ser duro com os extremistas islâmicos, mas sem praticar a tortura. “Como ex-professor de direito constitucional na Universidade de Chicago, o presidente Obama é um forte defensor dos direitos humanos e das liberdades civis”, lembrou. “Mas ele manterá uma forte presença militar diante do fracasso da diplomacia ou quando os Estados Unidos ou seus aliados sofrerem atentados”, acrescentou.

Mensagem
Ward J. Thomas, pós-doutor em ciência política pela Universidade Johns Hopkins e especialista do College of Holly Cross (em Massachusetts), acredita que Obama pretendeu enviar ao mundo a mensagem de que os Estados Unidos não podem se dar o direito de usar o meio que desejarem para combater o terror ou de ignorar a vontade da comunidade internacional. “As decisões de tornar os memorandos públicos e renunciar à tortura representam um desejo de indicar um claro rompimento com o governo Bush”, concordou.

De acordo com Thomas, Obama sabe que proteger o país de um ataque terrorista ainda é um desafio substancial. “O nosso atual presidente é mais sensível do que Bush. Obama sabe que, se alienasse as populações do mundo islâmico, ele agravaria o problema do extremismo a longo prazo”, observou. Mas o especialista admite que o democrata precisará ter jogo de cintura para desempenhar o papel de paladino dos direitos humanos. “Obama anda sobre uma linha bastante tênue. Ele quer distanciar seu governo das técnicas de interrogatório, mas precisa ser cuidadoso para não ferir o Partido Republicano”, explicou. Tanto que o chefe de Estado já se declarou aberto à criação de uma comissão bipartidária para investigar a tortura, mas prefere se distanciar da imagem de adepto a um processo contra oficiais da CIA. O risco é de desagradar aos aliados de Bush e minar o apoio do Congresso na votação de importantes projetos contra a crise financeira.

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