Matéria do jornal Valor Econômico, publicada no dia 2 de dezembro de 2008, fala sobre proposta para a redução do desmatamento de florestas tropicais, feita pela União Européia.
UE propõe 20 bilhões de Euros para conter desmatamento
Daniela Chiaretti, de Poznan
A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática começou ontem, em Poznan, na Polônia, com uma notícia que pode esquentar a temperatura das negociações nos próximos dias: a União Européia lançará uma proposta muito ambiciosa para conservar as florestas tropicais e evitar o desmatamento, ao custo de 20 bilhões de euros ao ano.
Esta é a boa surpresa. O outro lado da moeda é o objetivo da União Européia (UE) com as doações que pode fazer aos países donos das florestas. Parece meta de ONG, mas foi Artur Runge-Meztger, representante da UE, quem declarou: "A idéia é reduzirmos pela metade o desmatamento no mundo em 2020 e ter zero de desmatamento em 2030". Nos próximos dias a proposta será votada pelos países-membros da UE em Bruxelas e aterrissará em Poznan na segunda semana da megaconferência, junto com o alto escalão ministerial dos 190 países presentes.
O Global Forest Carbon Mechanism, como deve se chamar a proposta européia, é um meio trunfo para a diplomacia brasileira. A idéia de um fundo para salvar as florestas sem estar ligado ao mercado de carbono surgiu na Conferência de Nairóbi, em 2007, em discurso da ex-ministra Marina Silva. Foi recebido com ceticismo por quem não acreditava que alguma nação rica colocaria dinheiro como doação para não haver desmatamento, sem ganhar créditos de carbono por isso.
Mas foi assim que o Fundo Amazônia saiu do papel, com dinheiro norueguês e que deve receber U$$ 20 milhões nos próximos dias.
Agora, a proposta européia corre no mesmo trilho. "É doação, não empréstimo", reforça Runge-Meztger, chefe da unidade de clima, ozônio e energia da Comissão Européia, o braço executivo da UE. O problema está na possível contrapartida. "Exigir zero de desmatamento pode ser interpretado como interferência na soberania dos países", comenta um representante da delegação brasileira.
A União Européia não desistiu de ligar a redução de emissões por desmatamento a créditos de carbono. "Temos uma proposta de meio termo", continua o delegado da EU, sem detalhar como funcionaria o outro braço do financiamento a florestas, ligado ao mercado de carbono.
Segundo um relatório da FAO (órgão da ONU para agricultura e alimentos), 13 milhões de hectares de florestas são perdidos por ano no mundo, e o desmatamento responde por 20% das emissões globais de gases-estufa, que causam o aquecimento global.
Poznan pode ser a conferência das florestas. Além da proposta européia, o conceito de REDD - reduções de emissões por desmatamento e degradação - está presente em todas as esferas de discussão da CoP-14, como se chama a reunião de todos os países que assinaram a Convenção de Mudanças Climáticas das Nações Unidas.
São 11 mil pessoas reunidas no centro de convenções de Poznam entre delegados, cientistas e representantes de indústrias e ONGs. A CoP-14 acontece num inverno frio e em plena crise financeira global. "A crise terá impacto em seu trabalho assim como em muitos aspectos da nossa vida", disse na abertura Yvo de Boer, o secretário-executivo da UNFCCC, a convenção do clima. "A rota entre Poznan e Copenhague tem pela frente trabalho duro e crítico", afirmou, citando a próxima CoP, em dezembro de 2009, na Dinamarca, quando se espera assinar um acordo mundial de combate à mudança do clima.
"Só temos um ano. Mesmo se a crise financeira é severa e urgente, não pode ser desculpa para não combatermos a mudança climática", disse o primeiro-ministro da Dinamarca, Anders Fogh Rasmussen. "Esta é uma oportunidade única na vida, de passarmos de uma economia de alto carbono para de baixo carbono", continuou. "Esta é a melhor opção verde, econômica e política".
À frente de um grande painel exibindo um campo florido com uma cegonha voando num céu azul meio nublado, o anfitrião do evento avisou "que o planeta chegou ao limite" e que o cenário em que as coisas continuam como sempre foram "não é uma opção", disse Maciej Nowicki, ministro polonês do Meio Ambiente e presidente da conferência.
"Grandes secas e enchentes, ciclones com mais poder destrutivo, pandemias de doenças tropicais, um declínio dramático na biodiversidade - tudo isso pode provocar conflitos sociais e até armados, além de migrações de populações em escala sem procedentes", prosseguiu Nowicki.
A maior incógnita da reunião é o comportamento da delegação americana. Tanto De Boer como Rasmussen se referiram aos planos declarados do presidente eleito Barack Obama sobre o assunto como "metas ambiciosas". Ele falou em investir US$ 15 bilhões ao ano em energias renováveis e cortar as emissões do país em 2020, aos níveis de 1990 - sendo que elas já cresceram 14%. "Vocês acham isso ambicioso levando em conta as propostas européias?", disparou um jornalista britânico a Runge-Meztger. A UE já se comprometeu com metas de redução de 20% em 2020, podendo chegar a 30%. Ficou sem resposta. Essa provocação remete a um dos pontos delicados do processo: incluir os EUA, segundo maior emissor do planeta, no jogo de corte de emissões sem fazer com que os países ricos já comprometidos queiram rever suas metas.
A jornalista viajou com bolsa da Climate Change Media Partnership
UE propõe 20 bilhões de Euros para conter desmatamento
Daniela Chiaretti, de Poznan
A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática começou ontem, em Poznan, na Polônia, com uma notícia que pode esquentar a temperatura das negociações nos próximos dias: a União Européia lançará uma proposta muito ambiciosa para conservar as florestas tropicais e evitar o desmatamento, ao custo de 20 bilhões de euros ao ano.
Esta é a boa surpresa. O outro lado da moeda é o objetivo da União Européia (UE) com as doações que pode fazer aos países donos das florestas. Parece meta de ONG, mas foi Artur Runge-Meztger, representante da UE, quem declarou: "A idéia é reduzirmos pela metade o desmatamento no mundo em 2020 e ter zero de desmatamento em 2030". Nos próximos dias a proposta será votada pelos países-membros da UE em Bruxelas e aterrissará em Poznan na segunda semana da megaconferência, junto com o alto escalão ministerial dos 190 países presentes.
O Global Forest Carbon Mechanism, como deve se chamar a proposta européia, é um meio trunfo para a diplomacia brasileira. A idéia de um fundo para salvar as florestas sem estar ligado ao mercado de carbono surgiu na Conferência de Nairóbi, em 2007, em discurso da ex-ministra Marina Silva. Foi recebido com ceticismo por quem não acreditava que alguma nação rica colocaria dinheiro como doação para não haver desmatamento, sem ganhar créditos de carbono por isso.
Mas foi assim que o Fundo Amazônia saiu do papel, com dinheiro norueguês e que deve receber U$$ 20 milhões nos próximos dias.
Agora, a proposta européia corre no mesmo trilho. "É doação, não empréstimo", reforça Runge-Meztger, chefe da unidade de clima, ozônio e energia da Comissão Européia, o braço executivo da UE. O problema está na possível contrapartida. "Exigir zero de desmatamento pode ser interpretado como interferência na soberania dos países", comenta um representante da delegação brasileira.
A União Européia não desistiu de ligar a redução de emissões por desmatamento a créditos de carbono. "Temos uma proposta de meio termo", continua o delegado da EU, sem detalhar como funcionaria o outro braço do financiamento a florestas, ligado ao mercado de carbono.
Segundo um relatório da FAO (órgão da ONU para agricultura e alimentos), 13 milhões de hectares de florestas são perdidos por ano no mundo, e o desmatamento responde por 20% das emissões globais de gases-estufa, que causam o aquecimento global.
Poznan pode ser a conferência das florestas. Além da proposta européia, o conceito de REDD - reduções de emissões por desmatamento e degradação - está presente em todas as esferas de discussão da CoP-14, como se chama a reunião de todos os países que assinaram a Convenção de Mudanças Climáticas das Nações Unidas.
São 11 mil pessoas reunidas no centro de convenções de Poznam entre delegados, cientistas e representantes de indústrias e ONGs. A CoP-14 acontece num inverno frio e em plena crise financeira global. "A crise terá impacto em seu trabalho assim como em muitos aspectos da nossa vida", disse na abertura Yvo de Boer, o secretário-executivo da UNFCCC, a convenção do clima. "A rota entre Poznan e Copenhague tem pela frente trabalho duro e crítico", afirmou, citando a próxima CoP, em dezembro de 2009, na Dinamarca, quando se espera assinar um acordo mundial de combate à mudança do clima.
"Só temos um ano. Mesmo se a crise financeira é severa e urgente, não pode ser desculpa para não combatermos a mudança climática", disse o primeiro-ministro da Dinamarca, Anders Fogh Rasmussen. "Esta é uma oportunidade única na vida, de passarmos de uma economia de alto carbono para de baixo carbono", continuou. "Esta é a melhor opção verde, econômica e política".
À frente de um grande painel exibindo um campo florido com uma cegonha voando num céu azul meio nublado, o anfitrião do evento avisou "que o planeta chegou ao limite" e que o cenário em que as coisas continuam como sempre foram "não é uma opção", disse Maciej Nowicki, ministro polonês do Meio Ambiente e presidente da conferência.
"Grandes secas e enchentes, ciclones com mais poder destrutivo, pandemias de doenças tropicais, um declínio dramático na biodiversidade - tudo isso pode provocar conflitos sociais e até armados, além de migrações de populações em escala sem procedentes", prosseguiu Nowicki.
A maior incógnita da reunião é o comportamento da delegação americana. Tanto De Boer como Rasmussen se referiram aos planos declarados do presidente eleito Barack Obama sobre o assunto como "metas ambiciosas". Ele falou em investir US$ 15 bilhões ao ano em energias renováveis e cortar as emissões do país em 2020, aos níveis de 1990 - sendo que elas já cresceram 14%. "Vocês acham isso ambicioso levando em conta as propostas européias?", disparou um jornalista britânico a Runge-Meztger. A UE já se comprometeu com metas de redução de 20% em 2020, podendo chegar a 30%. Ficou sem resposta. Essa provocação remete a um dos pontos delicados do processo: incluir os EUA, segundo maior emissor do planeta, no jogo de corte de emissões sem fazer com que os países ricos já comprometidos queiram rever suas metas.
A jornalista viajou com bolsa da Climate Change Media Partnership
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