O jornal O Globo publica no dia 22 de dezembro matéria sobre a apreciação pelo sistema interamericano de direitos humanos do caso que envolve a morte do cadete Lapoente.
Morte do cadete Lapoente chega à corte da OEA
Comissão investigará caso do aspirante que teria sido torturado dentro da Academia das Agulhas Negras
Flávio Tabak
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) decidiu, no dia 9 de dezembro, apurar o caso do cadete Márcio Lapoente da Silveira, morto aos 18 anos durante um treinamento do Exército na Academia Militar das Agulhas Negras, em 1990. Agora, a investigação sobre a morte do cadete tramita na corte internacional, e a Advocacia-Geral da União terá que defender o país no caso.
A família pede a punição dos acusados pela morte do jovem, suspeito de ter sido torturado depois de passar mal durante exercícios. Segundo a petição, o inquérito policial militar do caso "não determinou o responsável pela morte da suposta vítima e foi arquivado". Ainda de acordo com o documento, a comissão da OEA já concluiu, no caso de Eldorado dos Carajás, que "os militares não gozam de independência e autonomia necessárias para investigar de maneira imparcial as supostas violações dos direitos humanos cometidas presumivelmente pela tropa".
Pais consideram decisão uma "vitória"
Como possíveis conseqüências do processo, o Brasil poderá sofrer sanções administrativas na OEA e ser obrigado a pagar uma indenização para a família do cadete. Segundo o grupo Tortura Nunca Mais, é a primeira vez que a OEA analisa um caso que envolve treinamento das Forças Armadas.
- A história do cadete é emblemática. Nenhum caso de tortura ou morte estranha que tenha acontecido dentro das Forças Armadas foi levado para a corte da OEA. Precisamos repensar o tipo de treinamento que é dado aos recrutas - disse a presidente do Tortura Nunca Mais, Cecília Coimbra.
O caso de Lapoente também tramita na Justiça comum. O oficial do Exército Antônio Carlos de Pessoa, acusado de ser o responsável pela morte, pode ser condenado a pagar uma indenização à família. A ação já passou pelo Tribunal Regional Federal e, depois da apreciação de um recurso, será encaminhada ao Superior Tribunal de Justiça. A petição foi levada à OEA por Joss Opie, advogado da organização não-governamental Justiça Global. A mãe do cadete, Carmen Lúcia Lapoente da Silveira, pede uma punição rígida.
- Lutamos há 18 anos pelo reconhecimento de que meu menino foi morto por tortura. Isso tudo é um desgosto para nós. Tive a ilusão de que eles reconheceriam o erro, mas acobertaram tudo. Essa decisão é uma vitória, sempre há um fundo de esperança. Eles estão escondendo oficiais que torturam - afirma Carmen.
O pai do cadete, Sebastião Silveira, que também é militar, conta que a OEA entrou no caso por mérito exclusivo de representantes da Justiça Global:
- Um advogado da Justiça Global ouviu nossos depoimentos e levou o caso para a OEA em 2004. O governo federal será notificado. A própria OEA explica no relatório que houve morte ocasionada por terceiros.
Dezoito anos depois, nenhuma punição
Acusação sustenta que jovem recebeu vários chutes de oficial após passar mal e desmaiar
Dezoito anos após a morte do cadete, nenhum militar foi punido. O advogado da família, João Tancredo, disse que o caso chegou à OEA por causa da morosidade da Justiça brasileira:
- Quando não há mais recursos no Brasil, o que resta é a Corte Interamericana. A questão fundamental é a demora na apuração e a falta de qualquer tipo de punição.
Segundo a acusação, o cadete Márcio Lapoente da Silveira estava em péssimas condições físicas depois de um intenso treinamento, chegando a ser carregado por colegas. Ao ver a cena, o oficial Antônio Carlos de Pessoa teria ordenado que todos continuassem marchando e agredido Lapoente no rosto, na barriga, nas pernas e nas nádegas. Os exercícios continuaram e a vítima apresentou ainda menos vigor físico, com desmaios constantes. Mesmo no chão, Lapoente teria sido chutado. Sem socorro adequado, ele morreu enquanto era levado a um hospital.
Há outros casos de crimes ocorridos no Brasil que chegaram à OEA. A investigação do massacre dos sem-terra de Eldorado dos Carajás, em 1996, e a interpretação da Lei da Anistia que teria beneficiado militares envolvidos em crimes durante a ditadura já foram cobradas pela corte da organização. A Comissão de Direitos Humanos também fez com que o governo do Ceará pagasse indenização de R$60 mil para a biofarmacêutica Maria da Penha, que dá nome à lei que endureceu as penas relacionadas a casos de violência doméstica.
Há outros casos, recentes, de indícios de abusos por parte de oficiais no Rio. Em setembro, o Ministério Público estadual e a Assembléia Legislativa investigaram uma denúncia de que um grupo de recrutas do Batalhão da Polícia Rodoviária Militar, em Niterói, foi torturado. Em junho, três estudantes da Academia das Agulhas Negras morreram enquanto participavam de um treinamento de sobrevivência.
Morte do cadete Lapoente chega à corte da OEA
Comissão investigará caso do aspirante que teria sido torturado dentro da Academia das Agulhas Negras
Flávio Tabak
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) decidiu, no dia 9 de dezembro, apurar o caso do cadete Márcio Lapoente da Silveira, morto aos 18 anos durante um treinamento do Exército na Academia Militar das Agulhas Negras, em 1990. Agora, a investigação sobre a morte do cadete tramita na corte internacional, e a Advocacia-Geral da União terá que defender o país no caso.
A família pede a punição dos acusados pela morte do jovem, suspeito de ter sido torturado depois de passar mal durante exercícios. Segundo a petição, o inquérito policial militar do caso "não determinou o responsável pela morte da suposta vítima e foi arquivado". Ainda de acordo com o documento, a comissão da OEA já concluiu, no caso de Eldorado dos Carajás, que "os militares não gozam de independência e autonomia necessárias para investigar de maneira imparcial as supostas violações dos direitos humanos cometidas presumivelmente pela tropa".
Pais consideram decisão uma "vitória"
Como possíveis conseqüências do processo, o Brasil poderá sofrer sanções administrativas na OEA e ser obrigado a pagar uma indenização para a família do cadete. Segundo o grupo Tortura Nunca Mais, é a primeira vez que a OEA analisa um caso que envolve treinamento das Forças Armadas.
- A história do cadete é emblemática. Nenhum caso de tortura ou morte estranha que tenha acontecido dentro das Forças Armadas foi levado para a corte da OEA. Precisamos repensar o tipo de treinamento que é dado aos recrutas - disse a presidente do Tortura Nunca Mais, Cecília Coimbra.
O caso de Lapoente também tramita na Justiça comum. O oficial do Exército Antônio Carlos de Pessoa, acusado de ser o responsável pela morte, pode ser condenado a pagar uma indenização à família. A ação já passou pelo Tribunal Regional Federal e, depois da apreciação de um recurso, será encaminhada ao Superior Tribunal de Justiça. A petição foi levada à OEA por Joss Opie, advogado da organização não-governamental Justiça Global. A mãe do cadete, Carmen Lúcia Lapoente da Silveira, pede uma punição rígida.
- Lutamos há 18 anos pelo reconhecimento de que meu menino foi morto por tortura. Isso tudo é um desgosto para nós. Tive a ilusão de que eles reconheceriam o erro, mas acobertaram tudo. Essa decisão é uma vitória, sempre há um fundo de esperança. Eles estão escondendo oficiais que torturam - afirma Carmen.
O pai do cadete, Sebastião Silveira, que também é militar, conta que a OEA entrou no caso por mérito exclusivo de representantes da Justiça Global:
- Um advogado da Justiça Global ouviu nossos depoimentos e levou o caso para a OEA em 2004. O governo federal será notificado. A própria OEA explica no relatório que houve morte ocasionada por terceiros.
Dezoito anos depois, nenhuma punição
Acusação sustenta que jovem recebeu vários chutes de oficial após passar mal e desmaiar
Dezoito anos após a morte do cadete, nenhum militar foi punido. O advogado da família, João Tancredo, disse que o caso chegou à OEA por causa da morosidade da Justiça brasileira:
- Quando não há mais recursos no Brasil, o que resta é a Corte Interamericana. A questão fundamental é a demora na apuração e a falta de qualquer tipo de punição.
Segundo a acusação, o cadete Márcio Lapoente da Silveira estava em péssimas condições físicas depois de um intenso treinamento, chegando a ser carregado por colegas. Ao ver a cena, o oficial Antônio Carlos de Pessoa teria ordenado que todos continuassem marchando e agredido Lapoente no rosto, na barriga, nas pernas e nas nádegas. Os exercícios continuaram e a vítima apresentou ainda menos vigor físico, com desmaios constantes. Mesmo no chão, Lapoente teria sido chutado. Sem socorro adequado, ele morreu enquanto era levado a um hospital.
Há outros casos de crimes ocorridos no Brasil que chegaram à OEA. A investigação do massacre dos sem-terra de Eldorado dos Carajás, em 1996, e a interpretação da Lei da Anistia que teria beneficiado militares envolvidos em crimes durante a ditadura já foram cobradas pela corte da organização. A Comissão de Direitos Humanos também fez com que o governo do Ceará pagasse indenização de R$60 mil para a biofarmacêutica Maria da Penha, que dá nome à lei que endureceu as penas relacionadas a casos de violência doméstica.
Há outros casos, recentes, de indícios de abusos por parte de oficiais no Rio. Em setembro, o Ministério Público estadual e a Assembléia Legislativa investigaram uma denúncia de que um grupo de recrutas do Batalhão da Polícia Rodoviária Militar, em Niterói, foi torturado. Em junho, três estudantes da Academia das Agulhas Negras morreram enquanto participavam de um treinamento de sobrevivência.
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