Correio Braziliense
24/07/2009
Rodrigo Craveiro
Entidades denunciam que golpistas cometeram execuções extrajudiciais
“Aparentemente, vemos uma calmaria por aqui. Mas pode vir uma noite em que eles entrarão em sua casa e o levarão.” As palavras da hondurenha Gabriela — ela não quis ser identificada, com medo de represálias — expressavam bem o clima em Tegucigalpa, às vésperas do anunciado retorno do presidente deposto Manuel Zelaya à capital. Também coincidiam com “graves violações” dos direitos humanos denunciadas ontem por 15 delegados da Federação Internacional de Direitos Humanos, do Centro pela Justiça e o Direito Internacional, entre outros organismos. “Nossa missão identificou a existência de graves violações aos direitos humanos ocorridas no país após o golpe de Estado”, afirmou Enrique Santiago, presidente da Federação de Associações de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos da Espanha.
Morador de Tegucigalpa, o empresário Armando Suárez F., de 39 anos, contou ao Correio, pela internet, que o presidente de fato, Roberto Micheletti, impôs um isolamento informativo e manipulador aos cidadãos, o que leva as pessoas a temerem a volta de Zelaya. “A guerra de tensão coletiva se soma a uma péssima energia sentida aqui. Essa tensão faz com que os moradores considerem que haverá uma batalha entre o bem e o mal”, alerta.
As violações denunciadas pela missão incluem execuções extrajudiciais durante o toque de recolher noturno, pressões sobre a imprensa não ligada ao governo de fato e “a suspensão dos direitos fundamentais dos hondurenhos”. As vítimas da violência citadas no informe incluem um jornalista, um político esquerdista, um sindicalista e um manifestante pró-Zelaya. Armando garantiu à reportagem que intelectuais, líderes ruralistas e sindicalistas foram capturados. “Alguns foram soltos, mas de outros nada se sabe”, disse.
Esforço
Numa última tentativa de pôr fim à crise, o presidente da Costa Rica, Oscar Arias, apresentou na noite de quarta-feira a Declaração de San José. No documento, ele propõe a formação de um “governo de unidade e reconciliação nacional” encabeçado pelo próprio Zelaya. Consultada pela reportagem, a economista Lesly Sánchez, de 32 anos, moradora de Tegucigalpa, opinou que não pode haver reconciliação nacional se Zelaya seguir com a ideia de instalar uma Assembleia Constituinte.
Até o fechamento desta edição, Zelaya preparava a volta ao país. Em entrevista concedida em Manágua, ele prometeu que cruzaria ainda hoje a fronteira desarmado. “Irei acompanhado de minha mulher e meus filhos”, disse. O temor de um banho de sangue era claro ontem. Com os policiais em greve, o Exército de Honduras começava a se concentrar na fronteira com a Nicarágua. A polícia nicaraguense reforçou sua presença na região e membros da chamada Resistência se dirigiam à área.
Em Brasília, o chanceler Celso Amorim defendeu o diálogo. “Não creio que os esforços não deram resultado, eles não foram esgotados, há coisas a fazer”, declarou. Ele lembrou que o Brasil sugeriu que países da região pressionem pelo retorno de Zelaya. “Os golpistas não têm futuro. Como instituição, não têm futuro. A questão é que eles compreendam isso logo, para evitar uma situação mais grave”, disse. “A comunidade internacional não será leniente se algo ocorrer com o presidente Zelaya.”
COLABOROU VIVIANE VAZ
“Não pode haver reconciliação se Manuel Zelaya seguir com a ideia de impor a Assembleia Constituinte. Pode haver reconciliação entre um povo diante da ingerência por parte de um governo estrangeiro? Somos soberanos e almejamos a paz. Nosso exército está preparado para garantir a segurança”
» LESLY SÁNCHEZ,
32, ECONOMISTA, VIVE EM TEGUCIGALPA
Arquivo Pessoal
“Meu país está dividido. Um dos graves problemas consiste no isolamento manipulador causado pelo governo de Roberto Micheletti. Isso se soma a uma péssima energia aqui. E faz com que os moradores considerem que haverá uma batalha entre o bem e o mal quando Manuel Zelaya retornar”
» ARMANDO SUÁREZ F.,
39, EMPRESÁRIO, VIVE EM TEGUCIGALPA.
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