segunda-feira, 13 de julho de 2009

Direitos humanos viram saia-justa para País na ONU

O Estado de S. Paulo

13/07/2009

Jamil Chade, Genebra
Decisões brasileiras em votações recentes têm sido criticadas por diplomatas de países ocidentais
A política externa brasileira para os direitos humanos causa polêmica e vítimas alegam que a estratégia brasileira pouco ajuda na defesa de suas causas. Enquanto democracias ocidentais criticam o País, governos africanos e outros emergentes comemoram a aproximação do Brasil a suas posturas e a estratégia de evitar confrontos nos plenários da Organização das Nações Unidas (ONU).
O objetivo declarado pelo Brasil é o de promover o diálogo no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Para o governo, essa postura é o que garante o real avanço dos direitos humanos. O Itamaraty justifica que não adota alinhamento automático às votações de casos de violações na ONU e avalia cada situação.
O que vem surpreendendo, porém, têm sido as decisões do Itamaraty, nos últimos meses, de poupar críticas à Coreia do Norte e sair em defesa do Sri Lanka. Essa política, porém, já vinha ganhando corpo nos últimos anos, com a decisão de evitar interferências a situações internas de países e dar espaço para que as regiões solucionem seus problemas. O Brasil também se absteve em debates sobre Darfur, Irã e República Democrática do Congo nos diversos órgãos da ONU.
Levantamento feito pela entidade Conectas, que mostra o padrão de votos do Brasil desde 2001 na ONU, mostra que o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva promoveu mudanças na posição do Brasil no tratamento de direitos humanos. Em junho, em Genebra, Lula confirmou a vertente da política externa de promover o diálogo e evitar confrontos.

DIÁLOGO
"O Brasil, no Conselho de Direitos Humanos, prega o engajamento construtivo, o diálogo. Dar lições ou condenar não contribui para melhorar a situação das vítimas de violações de direitos humanos", diz a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo. "O que interessa é o diálogo e quando o diálogo se dá no seio do Conselho de Direitos Humanos já é uma forma construtiva de criticar e de apontar a necessidade de mudanças."
Ex-presidente do conselho, o nigeriano Martin Ihoeghian Uhomoibhi elogia a posição brasileira. "O Brasil tenta ser construtivo, construir pontes." Responsável pela questão de direitos humanos na missão da Bolívia perante à ONU, Maysa Urena é outra que destaca "a nova posição do Brasil." "O País está sendo o exemplo da aproximação entre os países em desenvolvimento e de uma solidariedade cada vez maior." O governo da Argélia, ativo na defesa dos países muçulmanos, também não poupa elogios ao Brasil.
Em Genebra, no entanto, diplomatas de países ocidentais, parte da cúpula da ONU e vítimas de abusos de direitos humanos criticam o País. Para eles, foi uma "surpresa" a decisão de poupar críticas à Coreia do Norte, quando todos os demais países do Mercosul votaram por uma condenação da situação no país asiático. A abstenção brasileira ocorreu a poucos meses da tentativa do País de abrir uma embaixada na Coreia do Norte.
Esta semana, o Japão reagiu à decisão do Brasil. "Lamentavelmente, o Brasil mudou seu voto. Até agora não conseguimos entender o motivo", disse o responsável da diplomacia japonesa para temas de direitos humanos na ONU, Osamu Yamanaka.

MANOBRAS
Entre 2003 e 2005, o Brasil votou a favor de resoluções da ONU contra a situação na Coreia do Norte. Em 2007 e início de 2008, o País manteve o voto na Assembleia-Geral da ONU e no Conselho de Direitos Humanos, respectivamente. Mas a orientação mudou no fim de 2008, quando o Brasil preferiu apostar na participação norte-coreana no mecanismo de avaliação universal da ONU.
Um dos problemas do mecanismo, porém, é que as críticas e comentários sobre um país são elaborados por outros países, o que dá margem a manobras políticas. "A avaliação universal tem limites", disse Yamanaka.
Outro ponto que vem chamando a atenção é a insistência do Brasil votar em abstenção sempre que uma resolução aparece sobre o caso iraniano. Tradicionalmente, o governo adotou essa postura, mas havia caminhado para uma posição mais próxima a da Europa em 2003. Mas quando o Canadá, em 2008, apresentou resolução pedindo que as violações de direitos humanos no Irã fossem eliminadas, o Brasil mais uma vez se absteve.

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