sábado, 27 de junho de 2009

A questão hodurenha e o constitucionalismo latino-americano

Folha de São Paulo, sábado, 27 de junho de 2009


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Projeto de Zelaya não tem base social para ser imposto
Guinada em direção ao populismo ao estilo chavista veio de cima para baixo, não por pressões populares

Ao aderir à Alba (Aliança Bolivariana para as Américas) e ao tentar mimetizar em Honduras o processo constituinte do bloco chavista, o presidente Manuel Zelaya rompeu o quase bicentenário pacto pelo qual o seu Partido Liberal e o opositor Partido Nacional se revezaram no poder na maior parte do tempo desde a independência.
Porém, ao mesmo tempo em que a Justiça e a maioria das forças políticas hondurenhas, incluindo parte da agremiação governista, questionam a legalidade do processo e veem nele apenas a expressão da ambição presidencial de instituir a reeleição, Zelaya não está apoiado sobre uma base social suficientemente organizada para impor seu projeto aos adversários.
Ao contrário do presidente boliviano Evo Morales, a virada supostamente "popular" de Zelaya veio mais como proposta instituída de cima do que como resultado de pressões de baixo.
Aproveitando período de crescimento econômico de em média 5,5%, ele aumentou em 60% o salário mínimo e estreitou a relação do governo com grupos antes sem poder político, como os indígenas. Seus rivais, no entanto, frequentemente o acusam de pagar manifestantes em atos de apoio.
Honduras não tinha passado, nos anos recentes, por mobilização social expressiva.
Paradoxalmente, um movimento sindical que já foi forte decaiu quando a agricultura deu lugar em importância às maquiladoras -fábricas com isenção de impostos que produzem roupas e alimentos para grandes marcas americanas.
Além delas, são as remessas enviadas por imigrantes que disputam o segundo lugar em renda para a economia do país. As empresas dos EUA venderam suas terras nos anos 90, e hoje compram os tradicionais banana, café e tabaco locais.
A pulverização dos locais de trabalho teve reflexos no sindicalismo, cuja mobilização conseguiu arrancar de um governo dos liberais, em 1955, uma legislação trabalhista avançada para os padrões regionais, com instituição de salário mínimo e jornada de oito horas.
No livro "Power in the Isthmus" (1988), o britânico James Dunkerley, estudioso da América Central, atribui a reformas como essa a relativa estabilidade hondurenha no século 20, em comparação ao vizinhos.
Mesmo com uma série de semigolpes palacianos e de um governo militar que durou 17 anos, entre 1963 e 1980, Honduras não passou por uma onda repressiva das dimensões das que se abateram sobre El Salvador e Guatemala.
O país tampouco tem uma tradição forte de esquerda, e um incipiente movimento guerrilheiro foi logo desbaratado nos anos 80.

Nenhum comentário: