Jornal do Brasil
08/06/2009
Gian Carlos
PROFESSOR DE DIREITO INTERNACIONAL
Os recentes acontecimentos na chamada crise nuclear na Coreia do Norte trazem à tona o debate entre a soberania estatal e a segurança global. Em até certo ponto surpreendente uníssono, todos os países que se manifestaram condenaram oficialmente a realização dos testes nucleares norte-coreanos, ainda que haja divergências sérias entre EUA e China, por exemplo, no tocante às sanções a serem aplicadas à Coreia do Norte. A imprensa internacional também condenou de forma unânime tais atos. Por outro lado, o porta-voz norte-coreano afirmou, após os últimos testes, que seu país tem o direito como Estado soberano, de conduzir mísseis e testes nucleares e violar protocolos internacionais.
Existe claramente um sentimento geral de que a proliferação de armas nucleares representa um sério risco à segurança global. Esse sentimento, aliás, foi a inspiração para a celebração do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNPN), aprovado pela Assembléia Geral da ONU em 12 de junho de 1968. O próprio preâmbulo do TNPN deixa claros os objetivos de sua celebração, quais sejam, a necessidade de empreender todos os esforços para evitar a proliferação de armas nucleares, a qual aumentaria consideravelmente o risco de uma guerra nuclear, e de tomar medidas para resguardar a segurança dos povos tendo em vista a potencial devastação que uma guerra nuclear traria a toda a humanidade.
Ironicamente, porém, o TNPN foi denunciado pela Coreia do Norte em 2003, de forma que esse país se juntou a Índia, Paquistão e Israel como os únicos países com tecnologia atômica que não são partes no referido documento. No entanto, é importante salientar que a própria construção do TNPN desrespeitou um dos princípios mais essenciais do direito internacional – a igualdade jurídica dos Estados – uma vez que consagrou o direito de que as cinco potências atômicas existentes à época de sua celebração (EUA, Rússia, China, França e Inglaterra) mantivessem seu arsenal militar.
Sendo assim, consolidou uma desigualdade severa entre os países, agravada ainda pelo fato de que essas cinco potências são, coincidentemente, os membros permanentes (com direito de veto) no Conselho de Segurança da ONU, ao qual cabe votar e aprovar resoluções contra países que realizem testes nucleares proibidos.
Os argumentos da soberania estatal e do princípio da igualdade jurídica dos Estados serão certamente utilizados pelas autoridades norte-coreanas para fundamentar seu direito soberano de realizar testes militares nucleares e de desenvolver essa tecnologia. Por outro lado, os princípios que estão por trás do TNPN permanecem válidos e representam o interesse da maioria dos países membros da ONU – como se vê pela reação global contrária aos testes norte-coreanos, podendo ser contrapostos aos argumentos daquele país. Além disso, deve estar claro que a alegação de soberania estatal como fundamento para o desrespeito de normas internacionais é juridicamente reprovável.
Eventualmente, entretanto, como toda crise internacional, o assunto fugirá ao campo estritamente jurídico-legal e repousará no campo diplomático, onde interesses políticos, econômicos e comerciais, espera-se, possam acalmar os ânimos e levar os países a um acordo.
08/06/2009
Gian Carlos
PROFESSOR DE DIREITO INTERNACIONAL
Os recentes acontecimentos na chamada crise nuclear na Coreia do Norte trazem à tona o debate entre a soberania estatal e a segurança global. Em até certo ponto surpreendente uníssono, todos os países que se manifestaram condenaram oficialmente a realização dos testes nucleares norte-coreanos, ainda que haja divergências sérias entre EUA e China, por exemplo, no tocante às sanções a serem aplicadas à Coreia do Norte. A imprensa internacional também condenou de forma unânime tais atos. Por outro lado, o porta-voz norte-coreano afirmou, após os últimos testes, que seu país tem o direito como Estado soberano, de conduzir mísseis e testes nucleares e violar protocolos internacionais.
Existe claramente um sentimento geral de que a proliferação de armas nucleares representa um sério risco à segurança global. Esse sentimento, aliás, foi a inspiração para a celebração do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNPN), aprovado pela Assembléia Geral da ONU em 12 de junho de 1968. O próprio preâmbulo do TNPN deixa claros os objetivos de sua celebração, quais sejam, a necessidade de empreender todos os esforços para evitar a proliferação de armas nucleares, a qual aumentaria consideravelmente o risco de uma guerra nuclear, e de tomar medidas para resguardar a segurança dos povos tendo em vista a potencial devastação que uma guerra nuclear traria a toda a humanidade.
Ironicamente, porém, o TNPN foi denunciado pela Coreia do Norte em 2003, de forma que esse país se juntou a Índia, Paquistão e Israel como os únicos países com tecnologia atômica que não são partes no referido documento. No entanto, é importante salientar que a própria construção do TNPN desrespeitou um dos princípios mais essenciais do direito internacional – a igualdade jurídica dos Estados – uma vez que consagrou o direito de que as cinco potências atômicas existentes à época de sua celebração (EUA, Rússia, China, França e Inglaterra) mantivessem seu arsenal militar.
Sendo assim, consolidou uma desigualdade severa entre os países, agravada ainda pelo fato de que essas cinco potências são, coincidentemente, os membros permanentes (com direito de veto) no Conselho de Segurança da ONU, ao qual cabe votar e aprovar resoluções contra países que realizem testes nucleares proibidos.
Os argumentos da soberania estatal e do princípio da igualdade jurídica dos Estados serão certamente utilizados pelas autoridades norte-coreanas para fundamentar seu direito soberano de realizar testes militares nucleares e de desenvolver essa tecnologia. Por outro lado, os princípios que estão por trás do TNPN permanecem válidos e representam o interesse da maioria dos países membros da ONU – como se vê pela reação global contrária aos testes norte-coreanos, podendo ser contrapostos aos argumentos daquele país. Além disso, deve estar claro que a alegação de soberania estatal como fundamento para o desrespeito de normas internacionais é juridicamente reprovável.
Eventualmente, entretanto, como toda crise internacional, o assunto fugirá ao campo estritamente jurídico-legal e repousará no campo diplomático, onde interesses políticos, econômicos e comerciais, espera-se, possam acalmar os ânimos e levar os países a um acordo.
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