Folha de S. Paulo
15/10/2009
Flávia Marreiro, da reportagem local
Papéis podem ajudar apuração da Operação Condor, afirma ativista, que cobra transparência do Brasil
Martín Almada descobriu em 1992, nos arredores de Assunção, papéis sobre as ações da polícia política da ditadura Alfredo Stroessner (1954-89) no Paraguai. O achado dos chamados "Arquivos do Terror" ajudou a desvendar a Operação Condor -sistema coordenado de repressão que envolveu regimes militares sul-americanos, incluindo o brasileiro- e municiou a abertura de várias ações judiciais sobre crimes cometidos nos anos 70 e 80 na região.
Ontem, ao lado de militares, o ex-preso político de 72 anos participou de outro momento histórico. Desceu aos sótãos do Ministério da Defesa paraguaio para declarar aberta ao acesso público uma tonelada de papéis secretos das Forças Armadas -que abrangem das guerras do século 19 aos dias atuais.
A abertura foi determinada pelo presidente Fernando Lugo e responde a pedido que consta do relatório final da Comissão da Verdade e Justiça (CVJ) sobre o governo Stroessner, de 2008. O regime matou ao menos 59 pessoas, e outras 336 desapareceram.
"É um feito histórico para toda a América Latina", comemorou Almada, em conversa por telefone. "Pode permitir a criação de novas ações judiciais. Pode municiar as investigações que estão em curso aqui, na Espanha, na Argentina, no Chile."
No Paraguai, não houve lei de anistia, e violações de direitos humanos estão sendo investigadas. Na Argentina, a lei foi revogada, e no Chile, a Corte Suprema avalizou abertura de ações. No Uruguai e no Brasil há discussão do tema.
Almada diz ter encontrado entre os papéis um livro com a ata da primeira formação do Exército do país após a Guerra do Paraguai (1864-1870). Também há uma lista dos bolivianos feitos prisioneiros na Guerra do Chaco (1932-1935), quando o país enfrentou a Bolívia.
O advogado pregou que o Brasil -que proíbe acesso a vários conjuntos de documentos da ditadura e também sobre a guerra- siga o exemplo do Paraguai. "Que o Brasil libere os documentos sobre a guerra. Temos direito à nossa memória."
O governo brasileiro enviou neste ano ao Congresso projeto de lei sobre acesso a informação pública. O texto permite "sigilo eterno" de papéis que representem "grave risco às relações internacionais". É o caso, por exemplo, dos documentos sobre a demarcação de fronteiras ao final da guerra.
A ONU irá ajudar á o país na manutenção dos arquivos.
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