Folha de S~çao Paulo 10 de outubro de 2009
Papel em crise é mostra de novo Brasil, diz professor
A atitude do Brasil de acolher o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, na embaixada do país em Tegucigalpa faz parte de uma mudança histórica na maneira como o Brasil constrói suas relações diplomáticas com os demais países da América Latina. Esta é a avaliação do professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley e colunista da Folha Albert Fishlow.
Em seminário promovido pelo Center for Hemispheric Policy em Miami, na manhã de ontem, Fishlow disse que a estratégia do Brasil é tentar exercer um papel central na América Latina, comparável ao dos EUA na América do Norte.
"Estamos caminhando para um mundo multilateral e, se o Brasil é uma estrela em ascensão, os EUA são uma estrela cadente em termos de participação no comércio mundial e inovação", disse. Confira abaixo trechos de entrevista concedida à Folha após o seminário:
FOLHA - O senhor disse que as relações com os EUA são as melhores nos últimos 20 anos, mas até agora os EUA só enviaram ao Brasil o general Jim Jones, assessor de Segurança Nacional...
FISHLOW - Você tem outra realidade que está acontecendo no mundo: a importância do Irã, a Guerra do Afeganistão. O governo americano nem tem embaixador novo no Brasil [a oposição vem bloqueando a confirmação do nomeado, Thomas Shannon]. Como consequência não se poderia dizer nem que as novas relações dos anos Obama já começaram, de fato estamos esperando o começo.
FOLHA - O sr. tratou da estratégia do Brasil de se firmar como centro na América Latina. Como isso se reflete no caso da crise em Honduras?
FISHLOW - Para o Brasil representa algo importante. O fato é que as relações diplomáticas do Brasil foram construídas de modo a separar o país de outros vizinhos na América Latina e ter relacionamentos em português e não em espanhol. Só durante os últimos 20 anos houve uma tentativa de integração com o Mercosul. Há uma tentativa clara em relação à Venezuela, com a possibilidade de admissão no Mercosul. E o Brasil ainda não decidiu como tratar do assunto. O país tem relações ativas na ONU [Organização das Nações Unidas], na OMC [Organização Mundial do Comércio], em organizações internacionais. Há uma tentativa de definir melhor as relações políticas que devem existir como base na nova política do século 21.
FOLHA - No caso de Zelaya são novas relações com Honduras ou com a Venezuela?
FISHLOW - [Hugo] Chávez [presidente da Venezuela] tem muito a ver com a situação de Honduras. Ele escolheu a embaixada brasileira para Zelaya e está sempre tentando restabelecer Zelaya para construir uma base maior para a Venezuela na região.
FOLHA - Mas historicamente o Brasil tem tradição de não interferir em conflitos de outros países...
FISHLOW - É uma consequência inegável do crescimento, do maior patamar de crescimento econômico. Além disso, Lula e o Itamaraty estão tentando restabelecer o Brasil como um centro. [O ex-presidente Fernando Henrique] Cardoso foi criticado por todas as viagens para o exterior, mas Lula viaja muito mais. É uma consequência dessa evolução, mas [o país] ainda não tem estabilidade na definição do seu papel.
sábado, 10 de outubro de 2009
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